Os governos das Américas deveriam adotar ações conjuntas e padronizadas para atender ao processo de emigração de venezuelanos, segundo a Human Rights Watch (HRW) em um relatório divulgado hoje, no qual a entidade considerou esta a maior crise migratória dessa natureza na história recente da América Latina.
O relatório O êxodo venezuelano: A necessidade de uma resposta regional a uma crise migratória sem precedentes, divulgado hoje (3) pela entidade, documenta os esforços de governos sul-americanos para atender ao enorme número de venezuelanos que atravessam suas fronteiras, além de recentes obstáculos que ameaçam a possibilidade de os venezuelanos buscarem proteção. Em algumas ilhas do Caribe, os venezuelanos estão sujeitos a prisões e deportações arbitrárias e incidentes xenofóbicos, o que tem sido uma preocupação crescente, segundo HRW.
“Embora muitos governos tenham feito esforços excepcionais para acolher os venezuelanos em fuga, a escala crescente da crise exige uma resposta coletiva uniforme”, disse o diretor das Américas da Human Rights Watch José Miguel Vivanco. “Os governos devem adotar uma resposta consistente para garantir que pessoas forçadas a abandonar a Venezuela tenham a proteção que precisam para recomeçar.”
O Ministério das Relações Exteriores do Equador convocou uma reunião regional em Quito, hoje e amanhã, para tratar da emigração venezuelana. O Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) deve realizar outra reunião sobre o tema no próximo dia 5.
Mais de 2,3 milhões de venezuelanos, de uma população estimada em 32 milhões, deixaram o país desde 2014, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU). No entanto, há também muitas pessoas que deixaram o país sem que fossem registradas pelas autoridades.
Visita às fronteiras
Nos meses de julho e agosto deste ano, a Human Rights Watch fez investigações nas fronteiras da Venezuela com a Colômbia e o Brasil, onde entrevistaram funcionários do governo e das Nações Unidas, além de dezenas de venezuelanos que cruzaram a fronteira, advogados, especialistas e ativistas, para a elaboração do relatório.
“A crise política, econômica, de direitos humanos e humanitária na Venezuela cria uma combinação de fatores que leva os venezuelanos a deixarem seus lares, incapazes ou sem o desejo de voltar. Alguns poderão ser reconhecidos como refugiados; outros podem não preencher os critérios, mas precisam de proteção”, divulgou a HRW.
No relatório, a Human Rights Watch recomenda que os governos da região considerem a adoção de ações como um regime de proteção temporária que regularizaria a situação migratória de todos os venezuelanos, incluindo a autorização de trabalho e suspensão da deportação pelo menos até o julgamento de suas solicitações individuais de proteção.
Mecanismos regionais
Outra recomendação é adoção de um mecanismo regional para compartilhar responsabilidades e custos associados aos fluxos migratórios, incluindo reassentamento seguro, ordenado e voluntário de refugiados e solicitantes de refúgio entre os países da região, de acordo com sua capacidade de recebê-los, processar demandas e prover integração local.
“A Venezuela abriu suas portas para pessoas que fugiam das ditaduras e conflitos internos da América do Sul nos anos 70 e 80. Seus vizinhos agora têm a oportunidade e a responsabilidade de fazer o mesmo pelo povo venezuelano, e os governos que reunirão em Quito nesta semana para discutir o êxodo venezuelano devem assumir esta tarefa”, disse Vivanco.
A HRW ressaltou que os refugiados não podem ser forçados a regressar aos seus países de origem se tiverem um fundado temor de perseguição, como previsto pelo Princípio de Nonrefoulement do direito internacional.
Regras de visto
Brasil, Chile, Colômbia e Peru adotaram regras especiais para conceder permissões legais de residência aos venezuelanos; Argentina e Uruguai permitem que os venezuelanos solicitem um visto especial para os nacionais do Mercosul, apesar de a Venezuela ter sido expulsa do bloco em dezembro de 2016. Os venezuelanos podem solicitar um visto ligado à Unasul no Equador.
“Essas autorizações regularizaram a situação migratória de centenas de milhares de venezuelanos, ajudando-os a se estabelecer fora de seu país, a trabalhar, e a ter acesso a serviços básicos. No entanto, alguns venezuelanos relataram dificuldades para conseguir regularizar sua situação migratória e, recentemente, alguns governos dificultaram aos venezuelanos o acesso à permanência legal em seus países”, divulgou a entidade, o que prejudica o acesso a trabalho, escolas e serviços de saúde, além de expor os imigrantes à exploração sexual e laboral e ao tráfico de pessoas.
No Caribe, nenhum país adotou uma política de permissão especial para que os imigrantes venezuelanos residam legalmente em seus países e, de acordo com a HRW, a maioria não tem leis para regulamentar o processo de solicitação de refúgio. “Alguns venezuelanos com documentos emitidos pelo Acnur [Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados] foram detidos ou deportados para a Venezuela”, acrescentou a entidade.