Cotidiano

Problema da água no Rio requer soluções de longo prazo

A Companhia Estadual de Água e Esgoto (Cedae) iniciou ontem (29) o uso de argila ionicamente modificada na lagoa próxima à captação da Estação de Tratamento de Água (ETA) Guandu para evitar a proliferação da alga que produz a substância geosmina que altera o gosto e o cheiro da água distribuída a grande parte da população da região metropolitana do Rio de Janeiro. Especialistas entrevistados pela Agência Brasil avaliam, entretanto, que, apesar da necessidade de medidas de curto prazo para enfrentar a situação crítica, o governo tem que investir no saneamento de forma integral para resolver o problema.

A professora da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Iene Christie Figueiredo destacou que a utilização do carvão ativado para reter a geosmina, que começou na semana passada, e a aplicação da argila são medidas “próprias, mas puramente mitigatórias”.

“São medidas adequadas para minimizar um problema real. Essas medidas vão precisar ser postas em operação toda vez que tiver esses grandes eventos. Portanto, se a gente não resolve o problema, a gente vai ter que utilizar essas medidas com muita frequência. E a gente está convivendo hoje com um passado de descaso”, disse a especialista em saneamento ambiental.

Para ela, não há problemas no uso do carvão ativado e da argila. “Pelo contrário, a comunidade científica tem largos estudos sobre o uso dessas duas substâncias. Existe tecnologia, existem empresas capazes de fornecer equipamentos. Então, a gente não está falando de um experimento. A gente está falando de soluções que são adequadas em casos semelhantes em outros lugares do mundo. Não tem nada de irresponsável. Irresponsável é não cuidar do nosso manancial.”

De acordo com a professora, a população vai conviver com a iminência de um colapso no sistema de abastecimento de água do país se não for feito o esgotamento sanitário com o devido tratamento, a drenagem urbana e o manejo dos resíduos sólidos.

Já o professor do Departamento de Engenharia Sanitária e Meio Ambiente da Faculdade de Engenharia da Universidade do Rio de Janeiro (Uerj) Gandhi Giordano avalia que para enfrentar o problema no curto prazo é preciso fazer a limpeza de forma criteriosa do reservatório de Guandu e a dragagem dos rios que desembocam na lagoa próxima à captação e estão poluídos, carregados de esgoto e poluentes.

No médio e longo prazos, segundo o professor, o caminho é fazer obras de transposição dos rios poluídos ou mudança de captação do Guandu. Além disso, é preciso fazer a implantação de sistemas de tratamento de esgoto.

O especialista criticou, entretanto, o emprego da argila. Segundo ele, a lagoa tem grande extensão o que obriga que o produto tenha que ser aplicado em larga escala. “Não é um ambiente pequeno e fechado. É um ambiente aberto com entrada e saída de rios, tem ação de ventos. Tem muita interferência para que possam fazer o controle. É de alto risco também ficar colocando produto químico em reservatório porque pode provocar floração de outras algas que podem causar mais danos do que essa [geosmina]. Acho que eles estão no caminho errado.”

Cedae

Em nota, a Cedae disse que a argila indisponibiliza o fósforo, nutriente necessário para o crescimento de algas. O objetivo é impedir a proliferação excessiva de algas que possam interferir no tratamento da água captada no manancial.

“A argila já é utilizada no Rio Grande do Sul e na Bahia e foi usada no lago Serpentine, em Londres, e no lago Strathclyde, na Escócia. O produto possui registro junto ao Ibama; certificados internacionais para águas de abastecimento como o NSF/ANSI 60 (International Standard for Drinking Water Additives); e foi licenciado pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea) após apresentação de documentos que comprovam sua eficácia e segurança ambiental”, diz a nota.

A companhia informou que enviou no dia 14 de janeiro ao Inea pedido de autorização para utilizar a argila, aprovado pelo órgão no dia 23. Serão realizadas inicialmente três aplicações de teste, monitoradas por técnicos da Cedae, do instituto e da empresa fornecedora do material. O produto será aplicado por meio de embarcação equipada com sistema para dispersão homogênea sobre a superfície da água.