Cotidiano

Especialistas analisam propostas dos presidenciáveis para educação

A proposta de educação a distância para o ensino fundamental, do candidato à presidência da República Jair Bolsonaro (PSL), vai na contramão dos melhores sistemas de ensino do mundo. Já a federalização de escolas vulneráveis do ensino médio, proposta...

A proposta de educação a distância para o ensino fundamental, do candidato à presidência da República Jair Bolsonaro (PSL), vai na contramão dos melhores sistemas de ensino do mundo. Já a federalização de escolas vulneráveis do ensino médio, proposta por Fernando Haddad (PT), seria inviável do ponto de vista orçamentário. As análises foram feitas por especialistas a pedido da Interdisciplinaridade e Evidências do Debate Educacional (Iede), entidade que trabalha com estudo e divulgação de dados educacionais.

A entidade selecionou cinco propostas que constam nos planos de governo de cada um dos presidenciáveis e/ou foram defendidas por eles em diferentes momentos de suas campanhas. Cada uma delas foi analisada por especialistas escolhidos por terem uma trajetória de estudo em temas ligados às propostas e pela credibilidade no mundo acadêmico.

A proposta de ensino a distância de Bolsonaro é criticada pela pesquisadora da Fundação Carlos Chagas Gabriela Moriconi e pela diretora da faculdade de educação da Universidad Diego Portales, no Chile, Paula Louzano. “Bolsonaro afirma se inspirar na educação do Japão, mas propõe caminho oposto. Educação a distância desde o ensino fundamental, bandeira de Bolsonaro, não é adotada como política educacional por nenhum dos melhores sistemas de ensino. Para o pleno desenvolvimento das crianças, socialização é essencial”, defendem em artigo.

A proposta de federalização de Haddad é criticada pelo sociólogo e membro da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior, Simon Schwartzman.

“O custo de atender aos alunos das redes estaduais com o mesmo nível de gastos do sistema federal seria de R$ 173 bilhões, mais do que todo o orçamento atual do Ministério da Educação (MEC). Isto sem falar do pesadelo que seria trazer [da folha de pagamento dos estados para o governo federal] os atuais 250 mil professores de ensino médio”, diz Schwartzman, que foi presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O especialista também defende a manutenção da reforma do ensino médio aprovada no governo Michel Temer. Haddad quer revogar a reforma. “No novo formato [do ensino médio], os alunos poderão se concentrar em suas áreas de interesse, sem precisar estudar só para passar nas provas, e se abrirá a possibilidade de uma formação mais prática e aplicada para quem quiser e precisar se integrar mais rapidamente ao mercado de trabalho”, defende o especialista.

Escola sem Partido

A proposta de redução de cotas no ensino superior do candidato do PSL também é criticada, assim como uma das principais bandeiras de Bolsonaro para aeducação, a aprovação do projeto que institui o Escola sem Partido.

“O que as evidências internacionais mostram sobre as ideias do programa Escola sem Partido, proposta defendida por Bolsonaro, pode causar erosão da confiança entre alunos e professores e perdas para o aprendizado. Nos EUA, experiências semelhantes não deram certo”, dizem o pós-doutor em sociologia econômica pela Universidade Columbia Charles Kirschbaum e a doutora em economia pela Universidade de Illinois Regina Madalozzo. Ambos são professores do Insper.

Eles apontam os resultados do estudo Unsettled relations: Schools, gay marriage, and educating for sexuality. Educational Theory [Relações não resolvidas: escolas, casamento gay e educação para a sexualidade] que mostram que, em várias experiências ocorridas nos Estados Unidos, a neutralidade exigida aos professores não foi traduzida em uma neutralidade no ensino em si. “Ao contrário: a partir do silêncio obtido e do vácuo criado, os estudantes com opiniões mais fortes prevaleciam com relação à opinião dos mais fracos”, dizem.

Segundo eles, é somente através “do confronto aberto de ideias que poderemos exercer nosso direito à própria opinião. Do contrário, estamos sendo doutrinados da mesma forma, mas agora doutrinados para mantermos o que já está estabelecido”.

Também foram analisadas as propostas de inclusão da disciplina de educação moral e cívica nas escolas e a criação de universidades empreendedoras. As duas sugestões são criticadas pelos especialistas ouvidos.

Bolsa Permanência

Do programa de Haddad, os especialistas analisam a bolsa permanência, cujo intuito é ajudar financeiramente alunos mais vulneráveis a se manterem no ensino médio. Os pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), do campus de Ribeirão Preto, Fernando de Lollo e Daniel Santos ponderam que é necessário aprofundar as causas da evasão escolar. Na avaliação deles, sem descobrir os motivos pelos quais os alunos deixam a escola, a bolsa pode ser insuficiente.

Os especialistas ainda analisaram as propostas de educação integral nas escolas, ampliação de investimentos em ciência e tecnologia e criação de uma prova nacional para ingresso na carreira docente (como forma de centralizar os concursos públicos) – todas elogiadas no estudo disponível na íntegra na internet.