O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), manifestou na noite desta segunda-feira (12) o entendimento de que o tema do aborto deve ser decidido na Corte Suprema porque se trata de debate sobre direitos fundamentais da mulher, entre eles os direitos sexuais e reprodutivos, o direito de fazer escolhas existenciais e o direito à integridade física e psíquica da gestante.
“Nenhuma emenda constitucional pode impedir o desfrute de um direito fundamental porque, no caso brasileiro, seria violação de cláusula pétrea. Os direitos fundamentais têm aplicabilidade direta e imediata e, quando eles entram em rota de colisão, é o Poder Judiciário que deve dirimir a questão”, acrescentou.
De acordo com ele, uma das colisões de direitos fundamentais neste tema ocorre entre o da mulher e, “para quem acha que existe vida desde o momento da concepção, também os direitos fundamentais do feto”. As declarações foram dadas durante o 1º Congresso Internacional de Direito e Gênero, realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Barroso participou do painel Direitos Reprodutivos.
Para o ministro, é importante respeitar os diferentes pontos de vista. “Ninguém pode ser impedido de pregar contra a realização do aborto. O direito de ser contra deve ser respeitado e qualquer pessoa pode tentar convencer o mundo a não recorrer a este tipo de procedimento. Mas criminalizar é uma forma intolerante de lidar com a questão, pois significa a não aceitação da opinião do outro. Se você pensa diferente de mim, eu acho que você deve ser preso”, avaliou
Barroso disse ainda que permitir o aborto não é incentivá-lo. “O aborto é uma prática que deve ser evitada. Ninguém, evidentemente, acha que ele é uma coisa boa. Portanto, o Estado deve evitá-lo mediante educação sexual, distribuição de contraceptivos e amparando a mulher que deseja ter o filho e esteja em condições adversas. Defender a descriminalização não significa achar que o aborto deva ser incentivado”, afirmou.
O tema já vem sendo discutido no STF. No julgamento do Habeas Corpus 124.306, Barroso já havia se manifestado pela descriminalização do aborto. Além disso, o Supremo fez audiência pública para debater a descriminalização do aborto e instruir a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) apresentado pelo PSOL.
Assimetrias
A ministra Cármen Lúcia também esteve presente no evento. Ela participou mais cedo do painel “Gênero nas Instituições” e defendeu que o direito tem o papel de enfrentar assimetrias. “Queremos uma sociedade de homens e mulheres que possam ser o que querem ser. Não somos minoria. As mulheres são a maioria da população brasileira. Entretanto, os nossos direitos ainda são considerados minoritariamente”, avaliou.
Segundo a ministra, o direito não é capaz de acabar com o preconceito, mas pode vedar a sua manifestação. Ela destacou as medidas que têm contribuído para a entrada de mais mulheres na magistratura, mas assinalou dificuldades para progressão na carreira, fazendo com que, em segunda instância, ainda exista um número bem inferior de desembargadoras. De acordo com Cármen Lúcia, a mudança não é uma questão de tempo. “Não é com o tempo. É com o esforço de nós, brasileiros, que queremos que as pessoas possam ser livremente iguais e igualmente dignas”.