LIBERTADORES

Crônica de Fluminense 2 x 2 Inter: a metamorfose

O jogo da volta das semifinais é na quarta-feira (4). Vitória simples leva à final. Em caso de empate, a decisão será nos pênaltis

Foto: Twitter SC Internacional/Divulgação

“…Porto Alegre, 27 de setembro de 2023. O Guaíba ultrapassa sua cota de inundação. Diversos pontos da orla na Capital gaúcha transbordam água do Lago. Venta frio e forte, como se cortasse a cada rajada. Mas também é dia de futebol. Longe dali, o Inter iniciava a disputa por uma vaga na final da Libertadores com o Fluminense, no Maracanã. Nosso amigo colorado, que acompanha aflito a caminhada do time na competição continental, sente algo mudar…”

Na manhã de quarta-feira (27), após uma madrugada de sonhos intranquilos, o colorado encontrou-se em sua cama metamorfoseado num E.T. monstruoso. Sua cabeça lisa ocupava toda a largura da cama. Suas pernas finas ultrapassavam, com seus pés compridos, a extremidade do colchão. Assustado, ele levanta rápido em direção ao espelho, deixando um rastro de gosma verde no lençol e no chão. Ao ver sua imagem, arregala os já grandes olhos pretos, soltando pela boca miúda um grito, como um zunido, extremamente agudo.

Ele para um segundo, respira e olha na janela, o céu nublado de Porto Alegre, que volta e meia traz chuviscos esparsos. “O que terá acontecido comigo? Já posso ver que não é um sonho”, pondera. E logo hoje, dia de Libertadores. Sorte que ele estava sozinho no apartamento, assim sua condição não geraria nenhum alarde em amigos e familiares. O plano então seria se preparar com o que havia disponível em casa, ver o jogo sozinho e esperar passar essa situação.

Nos grupos já rolavam as farpas, as “vacinas” e as flautas. Ele foi cumprindo suas obrigações, até que chegou à noite e ele sentou em frente a TV, com cerveja e petiscos. Mesmo sua forma ET gostava deste ritual. Por um instante ele pensou que poderia curtir seu novo corpo. Então veio a partida.

Maracanã lotado, com mais de 60 mil pessoas. Os colorados também compareceram em peso, tendo chegado de todas as formas. Em campo, um jogo movimentado desde o início. Ambas as equipes tiveram chances até o gol do Fluminense, aos 9. Arias se antecipou a Renê, avançou e tocou para John Kennedy. Rapidamente ele achou o artilheiro Cano. De primeira, ele abriu o placar.

No momento do gol, o colorado agora E.T. viveu momentos estranhos. Seu corpo tinha espasmos eufóricos que o faziam cuspir seus petiscos. Era um sentimento difícil de nomear. Devia ser a adrenalina do jogo, muito bom até aquele momento. Mas não poderia ser alegria, não dele, um colorado de nascença. Esta negação evocava lembranças que o aturdiam.

O jogo seguiu. Após longuíssimos minutos de controle do Fluminense na partida, sempre com toques refinados, aos poucos o Inter foi recobrando a presença na partida. Principalmente com Enner Valencia, sempre incomodando a lenta defesa adversária. Eis que foi em uma falta em cima dele que o lateral direito Samuel Xavier, do Fluminense, acabou expulso. A história do jogo mudou, assim como o sentimento do nosso extraterrestre.

Agora era seu estômago, já citado em outras crônicas, que estava embrulhado. Mais uma sensação que ele desconhecia a causa e o nome. Fato é que os minutos seguiram e, ainda no primeiro tempo, veio o empate do Inter, com Hugo Mallo, de cabeça. O jogo foi para o intervalo com o Inter mais animado e o ET com a barriga em revertério. “O que estará acontecendo comigo?”.

No segundo tempo, já não havia cerveja nem petiscos. Tudo era a aflição da partida. Fernando Diniz tirou Ganso e Felipe Melo para dar mais solidez ao meio e à defesa, mas sem abdicar de atacar. O Inter veio para matar o jogo. Teve um gol bem anulado de Mercado e, em seguida, virou o jogo com Alan Patrick, aos 18. Nosso ET correu para o banheiro. Precisava vomitar.

Pensou em desligar a TV, mas ele decidiu ver mesmo assim. Coudet fez trocas que, ao que parece, frearam o Inter. O Fluminense se tranquilizou e mesmo com um a menos, começou a incomodar o Inter. Até que, aos 32, Arias cobrou um escanteio, obtido pelo time da casa após erro defensivo da equipe gaúcha, Nino escorou de cabeça e Cano se antecipou com o pé ao marcador, dentro da área, para empatar a partida.

No sofá, o ET via os minutos finais com um misto de tensão e expectativa. Quando o árbitro apontou o término, seu corpo se afundou. Ele só queria dormir para acordar no dia seguinte com um pouco de conforto, menos cindido. A vida é explorar diferentes pontos dos cosmos, mas também é trabalhoso estar sempre limpando rastros de gosma.