
A Câmara dos Deputados aprovou a PEC 3/2021, que tenta reinstaurar uma proteção aos parlamentares já derrubada em 2001: a exigência de aval do Legislativo para que deputados e senadores sejam processados criminalmente. Batizada de PEC da Blindagem, mas chamada nas redes sociais de “PEC da Bandidagem”, a proposta reacende o debate sobre impunidade no Congresso. E ressuscita casos marcantes da década de 1990, quando centenas de pedidos de investigação foram barrados pelo próprio Parlamento.
A medida busca alterar a Emenda Constitucional 35, aprovada em 2001 após pressão popular. A norma eliminou a necessidade de autorização prévia da Câmara ou do Senado para abertura de ações penais contra membros do Congresso, diante de inúmeros casos de impunidade e blindagem de políticos acusados de crimes graves.
Casos de impunidade que chocaram o país
Entre os exemplos que impulsionaram a emenda de 2001 está o caso de Hildebrando Pascoal, o chamado “deputado da motosserra”. Eleito em 1998, foi condenado por tráfico de drogas e homicídios, incluindo o esquartejamento de desafetos. Mesmo com provas contundentes, o Congresso preferiu cassá-lo antes de autorizar a abertura de processo criminal, evitando assim criar jurisprudência.
Outro caso emblemático foi o do engenheiro e deputado Sérgio Naya, responsabilizado pela tragédia do Palace 2, edifício que desabou no Rio de Janeiro em 1998, matando oito pessoas. A repercussão acelerou a tramitação da emenda.
Também contribuiu para a mudança o caso do senador Ronaldo Cunha Lima, que atirou no adversário político Tarcísio Burity dentro de um restaurante em João Pessoa, em 1993. Burity sobreviveu ao ataque.
Mas Ronaldo Cunha Lima só foi processado após a vigência da nova regra. E, mesmo assim, fez de tudo para fugir do processo: renunciou ao cargo um dia antes do julgamento no STF, transferindo o caso para o júri popular. Morreu, em 2012, sem ser responsabilizado pelo crime.
Imunidade ou impunidade?
A jornalista Tereza Cruvinel, que acompanhou a Constituinte de 1988 e cobriu o Congresso durante os anos 1990, lembra que a blindagem inicialmente criada na Constituição pós-ditadura pretendia proteger parlamentares contra perseguições políticas. Com o tempo, no entanto, passou a ser instrumento de obstrução da Justiça.
“Quase 300 pedidos foram negados até 2001. A aprovação da EC 35 foi uma reação da sociedade àquela proteção extrema”, relatou.
A analista legislativa Orlange Maria Brito defende que o mecanismo perdeu sentido após a consolidação democrática. “Ele foi desvirtuado. Não há mais o cenário de autoritarismo que justificava tamanho escudo institucional”, escreveu.
Risco de retrocesso
Entidades como a Transparência Internacional e a Associação dos Magistrados Brasileiros alertam que a PEC da Blindagem pode favorecer a corrupção, especialmente nos casos ligados ao uso de emendas parlamentares.
Conforme a PEC, o processo criminal contra um parlamentar só poderá avançar com autorização da maioria da casa legislativa (Câmara ou Senado), e por voto secreto — exatamente o modelo que vigorou até 2001.
Argumentos dos defensores
Os defensores da proposta alegam que ela resguarda o mandato popular contra abusos do Judiciário. O relator da PEC, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), afirma que o objetivo é “proteger o Legislativo”. “Não é licença para cometer crimes, mas garantia de respeito à soberania do voto”, disse.
O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) também rejeita críticas. “Quem cometer crime vai pagar. É simples. Votamos e mostramos que a casa é contra criminosos”, declarou durante a sessão.
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