Hoje (17) percorro a rodovia, mas não é noite, nem chove. Quedou-se um vento levemente frio pelo litoral do Rio-Grande. E o céu é azul, posso confirmar. Miro este cenário solito de dentro do carro, enquanto o rádio toca Milton. Introspectivo, minha voz não se propaga na BR, mas penso, sinto e ouço, na voz que vem deste novo clima. Chamo-me Jorge, o “Gremistão” e estou aqui novamente. Ao que parece, F. esticou as férias.
Mas falava da voz das estradas. É algo de hipnótico, convidando ao cataclismo da vida. Escuto o mar, a maior das metáforas. Este trecho entre o cais e o inacabável. Há muito vivo a calmaria, mas com um coração à deriva. A essa altura, restam-me âncoras. A voz enigmática de minha filha Cláudia Berenice: “Pai, como é possível inventar origens quando tudo chega ao fim?” . Respondo a mim mesmo, assoviando baixinho: “Quando nosso lado coisa está prestes a ir ao encontro das demais coisas todo sopro vira instinto, minha filha”.
É assim que o Grêmio, essa “coisa” que pretensiosos muitas vezes minimizam, integra minha vida. O Tricolor é meu sopro de existência. Carrego ele aonde vou, com uma bruma de lembranças e afetos. Talvez por isso, tenha colocado um símbolo do Imortal na minha bengala, pois, de fato, ele me ajuda a andar. Desço do carro e entro em casa. Só? Não, tem jogo do meu time. O Grêmio recebe na Arena o Athletico, pelo Campeonato Brasileiro.
O Renato escalou o João Pedro Galvão no lugar do Diego Costa, que teve desconforto muscular. O pessoal gosta de vaiar o JP, mas eu não entro muito nessa. Lá pelas tantas do jogo o Renato até pediu para a torcida pegar leve. Mas isso é só um parênteses, vou ficar um pouco menos lírico a partir de agora porque sei de seu interesse leitor (a) (e). O Grêmio ganhou por 2 a 0. Pronto falei.
Calando os críticos
Um gol do Cristaldo, aos 18 do primeiro tempo, e outro do Soteldo, o início da etapa final. Os dois jogadores fizeram gestos com as mãos nos ouvidos, como que aludindo a críticas pelos maus resultados pós-Gauchão. De modo geral, a atuação do Grêmio soou como uma superação às partidas recentes. Até abrir o placar hoje, senti o Athletico mais inteiro no jogo. Poderia até ter marcado de fora da área, aos 11, com Cuello.
Mas veio o gol do Cristaldo. Pavón chutou da entrada da área e o argentino se atravessou para chutar para o gol. O desvio foi muito rápido, o que não deixou que o goleiro Bento, principal nome do Athletico, fizesse a defesa.
O gol colocou o adversário para baixo. Foram pelos menos uns 15 minutos de superioridade tricolor, com alguns chutes relativamente perigosos, em jogadas comandadas por Pavón. Até que veio a troca de Cuello por Alex Santana, que recolocou a equipe paranaense na partida. Mas o primeiro tempo acabaria neste quadro.
Sem resistência
O Grêmio, contudo, não deixou o Athletico criar asas. Voltou melhor do intervalo, até que veio o gol de Soteldo. O venezuelano recebeu passe de Villasanti dentro da área e fez o gol com facilidade. Aí sim, se desfez qualquer resistência da equipe paranaense. O Grêmio teve somente a notícia ruim de Pavón, que teve dor muscular e foi substituído por Gustavo Nunes.
De resto, o Grêmio foi, ao natural, acumulando chances contra um rival já combalido. O principal destaque foi, como dito, Bento, que interviu em mais de um lance. O Tricolor, graças, voltou a vencer, tem três pontos no Brasileiro, e enfrenta, no próximo sábado, o Cuiabá, em casa, às 18h30, pela terceira rodada da competição nacional.
Minhas saudades
Reporto todo este dia via email para minha filha Cláudia Berenice. Passado, presente e futuro baixam em meu corpo. Meus dedos tamborilam como a Banda Louca do Imortal. Até vou beber aquele vinho. A cada gole, as vozes da estrada me alucinam. Sou eu, mas perdido na inutilidade de ser.