A organização não governamental Ação da Cidadania, fundada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, em 1993, começou hoje (25) a distribuir no Rio de Janeiro 40 toneladas de cestas de alimentos não perecíveis para entidades já cadastradas, englobando moradores de comunidades de comitês da Ação da Cidadania. São priorizadas famílias em situação de insegurança alimentar iminente e aquelas que contraíram o novo coronavírus.
Em parceria com o Movimento Bem Maior e a plataforma de crowndfunding (financiamento coletivo) Benfeitoria, a Ação da Cidadania lançou campanha há cerca de duas semanas para arrecadar doações em dinheiro que são usadas na compra de cestas com alimentos não perecíveis e materiais de higiene para os trabalhadores e famílias impactados pelo novo coronavírus e que, no momento, estão impossibilitados de gerar renda. Para participar da campanha, as pessoas interessadas devem acessar o site Benfeitoria. Clique aqui.
Em entrevista à Agência Brasil, o diretor executivo da Ação da Cidadania, Kiko Afonso, contou que a ONG já estava no final da campanha para atendimento às populações atingidas pelas chuvas de fevereiro na Região Sudeste e se dispunha a pensar em outras áreas que não a de alimentos, quando eclodiu a crise do coronavírus.
“A gente teve que voltar a fazer a campanha e reforçar ainda mais, porque é algo que a gente nunca viu antes a demanda como estamos recebendo agora”.
Kiko Afonso informou que os pedidos vêm de todos os estados do Brasil. Para atender as famílias vítimas das fortes chuvas, foram doadas 400 toneladas de alimentos nas áreas mais afetadas do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.
Cuidados
Segundo ele, entidades que ajudavam a ONG anteriormente, hoje estão pedindo também doações. “Está um caos porque até a mobilização da sociedade está prejudicada porque falta voluntários, em razão do isolamento forçado como prevenção ao coronavírus. As pessoas têm medo de sair, com toda a razão”.
No trabalho que vem sendo feito pela ONG e seus parceiros, Afonso relatou que são tomados todos os cuidados possíveis, porque existe um risco no trabalho de distribuição de alimentos. Mas se isso não for feito, as pessoas vão acabar morrendo de fome. “A gente está seguindo todos os procedimentos indicados pelas autoridades sanitárias para fazer chegar esse alimento às famílias, sem contaminar ninguém e, ao mesmo tempo, da maneira mais rápida possível”. Para evitar aglomerações, a distribuição de alimentos no Rio de Janeiro continuará até a próxima sexta-feira (27), no galpão da Ação da Cidadania, localizado na Avenida Barão de Tefé, 75, bairro da Saúde, na região central da capital fluminense.
Na semana passada, a Ação da Cidadania distribuiu 60 toneladas de alimentos nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. De hoje (25) até sexta-feira, serão distribuídas mais 70 toneladas no Rio de Janeiro. “A campanha está só começando”, ressaltou Kiko Afonso. A ONG está fazendo contatos com diversas empresas e grupos de grandes doadores e grandes indústrias para tentar arrecadar doações maiores ao longo dos próximos três meses.
Caos social
“Porque se isso não acontecer, o país vai entrar em um caos social gigantesco. São dezenas de milhões de pessoas que se juntam aos 15 milhões de pessoas na extrema pobreza do dia para a noite. Isso é sem precedentes no Brasil. Uma coisa repentina, com paralisação de praticamente todos os serviços sociais, porque, se a gente não se mobilizar, vai ter um caos social muito grande”, externou o diretor executivo da ONG.
A campanha deve se estender até o mês de maio. “A gente não consegue enxergar algo no curtíssimo prazo que não seja até final de maio, porque toda a parte de quarentena irá até esse mês, com certeza. E as pessoas têm que receber o alimento porque, a cada dia que passa, a situação piora”.
Segundo Kiko Afonso, é preciso ter uma visão de longo prazo e investimento em segurança alimentar, que não se tinha há muito tempo. Na opinião dele, o Brasil e o mundo olham para a questão da segurança alimentar de uma maneira secundária nos investimentos sociais. A média mundial de doações para o objetivo de fome zero, dentro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), equivale a 2% do total, informou o diretor executivo. Outras pautas, como bem-estar e meio ambiente, recebem em torno de dez a 15 vezes mais que a questão da fome, acrescentou.
Questão básica
Para Afonso, a questão da fome é básica porque sem alimento, não adianta dar saúde e educação porque a pessoa não consegue sobreviver. “Espero que as pessoas saibam a dimensão desse problema e consigam entender que a questão da segurança alimentar e a necessidade de se investir nisso são fundamentais”. A Ação da Cidadania quer desenvolver ações de longo prazo para atender essa parcela da população. Um dos projetos visa à criação do Fundo Betinho que possa ter aportes volumosos de investimento. “A gente quer criar um fundo de, no mínimo, R$ 50 milhões para que ele possa ser perene no combate à fome e não pare quando a crise passar, como acontece em muitos países”.
Além da campanha com o Movimento Bem Maior e a Benfeitoria, a ONG conta com parceria das empresas ‘iFood’ e AME Digital, que disponibilizaram os aplicativos deles para doações de forma rápida. Não estão sendo aceitas doações de alimentos de pessoas físicas, como prevenção ao coronavírus. As doações são somente em dinheiro. Kiko Afonso explicou que na escala que a ONG compra de alimentos de grandes distribuidores, R$ 1 doado equivale a um prato de comida, porque a Ação da Cidadania consegue comprar mais barato do que nos supermercados.
Ainda esta semana, Afonso espera estender a distribuição de cestas para Brasília. Ele está “rezando” para que as parcerias que estão sendo alinhavadas no momento deem certo, para que a ação se espalhe por todo o país. A ideia é ir também para o Norte e Nordeste do Brasil, onde as entidades que fazem parte da ONG há muitos anos já estão solicitando doações. “Nós queremos atendê-las o mais rápido possível”. De acordo com o diretor, é muito importante que as grandes empresas colaborem com doações, que podem ser de qualquer valor. Muitas pessoas doam apenas R$ 1. “Mas nós somos muito agradecidos por todo real que entra”, manifestou Kiko Afonso.