A alta comissária da Organização das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, apresentou hoje (18) um novo relatório sobre a situação na Venezuela. Entre os temas abordados estão a liberação de presos políticos, a falha no acesso à saúde e educação, os altos índices de violência e a preocupação com uma possível incorporação das milícias às Forças Armadas nacionais.
A alta comissária da ONU, em sua apresentação hoje, em Bruxelas, demonstrou preocupação com apelos de altas autoridades venezuelanas para que continuem a armar as milícias, bem como a apresentação, no Congresso, de um projeto de lei que fortalece e incorpora as milícias às Forças Armadas Nacionais da Bolívia.
Bachellet afirmou ainda que membros de sua equipe fizeram visitas a nove centros de detenção e entrevistaram, de maneira confidencial, mais de 70 pessoas privadas de liberdade. Foram detectados 118 casos (109 homens e 9 mulheres) que requerem uma resposta urgente por motivos de saúde, atrasos em processos judiciais e demora na liberação de pessoas que já cumpriram suas penas.
“Destaco a liberação em setembro e outubro de 28 pessoas (24 homens e 4 mulheres) privadas de liberdade por motivos políticos e exorto as autoridades a liberar incondicionalmente todas as pessoas detidas por motivos políticos, incluso militares. Reitero meu pedido para que se continue dando cumprimento às orientações do Grupo de Trabalho sobre detenções arbitrárias”, afirmou Bachelet.
Bachellet relatou atos de assédio, ameaças e detenções pelos serviços de inteligência e forças de segurança, além de outros casos de restrição das liberdades públicas que “limitam o espaço cívico-democrático”, como a detenção de jornalistas.
Economia
Em relação à situação econômica e social, a alta comissária da ONU afirmou que a crise continua afetando os direitos dos venezuelanos. De acordo com a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), em 2019, a economia do país sofrerá uma contração de 25,5%, atingindo uma perda acumulada do Produto Interno Bruto (PIB), de 62,2% desde 2013.
“Embora nos últimos meses tenha havido melhora no suprimento de alimentos, apenas a minoria da população com acesso a divisas estrangeiras pode cobrir regularmente os altos preços dos alimentos devido à hiperinflação e à dolarização de fato da economia”, relata Bachellet, acrescentando que o salário mínimo no país cobre apenas 3,5% da cesta básica.
Na apresentação, feita hoje em Bruxelas, Bachellet disse que sua equipe visitou a cidade de Maracaibo, onde verificou longas filas para comprar combustível com prolongados e repetidos cortes de eletricidade, que também afetam o abastecimento de água. “Os direitos à saúde e educação também foram afetados, principalmente devido à falta de pessoal, infraestrutura precária e falta de insumos”.
Segundo Bachellet, durante o mês de novembro, a Caritas informou que, nas paróquias mais pobres de 19 estados do país, 11,9% das crianças apresentam sinais de desnutrição aguda – um aumento de 56% em relação a 2018 – e que 32,6% têm atrasos de crescimento. A Caritas também relatou que 48,5% das gestantes atendidas apresentam deficiências nutricionais.
Violência
Diante da ausência de dados oficiais atualizados e públicos, o Observatório Venezuelano da Violência estimou uma taxa de 60,3 homicídios violentos por 100 mil habitantes de janeiro a novembro de 2019. Embora tenha havido uma redução em relação a 2018, o número segue sendo um dos mais altos da região.
“Reitero minha preocupação com os níveis de violência que nos últimos meses também impactaram os líderes políticos locais, como ilustrado pelos assassinatos do ex-vereador da oposição Edmundo “Pipo” Rada Angulo e do ex-governador oficialista Johnny Yáñez Rangel. De agosto até hoje, meu escritório documentou alegações de supostas execuções extrajudiciais por membros das Forças de Ações Especiais (FAES), principalmente contra jovens, no contexto de operações de segurança em favelas”.
Bachellet afirmou ainda que vê com preocupação altos índices de violência e a presença de grupos armados irregulares envolvidos em exploração ilegal de recursos naturais.
Migrações
A Plataforma de Coordenação das Nações Unidas para Refugiados e Migrantes da Venezuela estima que 4,7 milhões de venezuelanos deixaram o país e projeta que esse número chegará a 6,5 milhões no final de 2020.
“Estou preocupada com o aumento da migração irregular devido, por um lado, às maiores exigências de entrada em alguns países de trânsito e destino, mas também pelas dificuldades que o povo venezuelano enfrenta na obtenção de sua documentação de viagem. Recentemente, as autoridades venezuelanas aumentaram o custo da emissão de passaportes em 70%, um custo equivalente a 54 salários mínimos. O uso de rotas mais perigosas e a exposição ao tráfico de pessoas aumentaram”, afirmou.
Ano eleitoral
“É crucial garantir as liberdades públicas que são fundamentais para criar as condições necessárias para eleições livres, imparciais, credíveis, transparentes e pacíficas. A esse respeito, estou preocupada com a retirada da imunidade de cinco deputados da oposição, aumentando o total para 30 deputados privados de imunidade, bem como com atos de assédio contra representantes da oposição, incluindo o presidente da Assembleia Nacional”, afirmou a alta comissária da ONU, demonstrando preocupação com o processo eleitoral de 2020.