Representantes do Facebook e do Twitter foram questionados por senadores em audiência promovida hoje (5) pelo Comitê de Inteligência. Entre os diversos temas abordados, os parlamentares cobraram os executivos pela dificuldade em combater a influência de outros países no debate político nas redes sociais e em processos eleitorais. Os políticos também criticaram os prejuízos causados pela disseminação de desinformação (e das chamadas notícias falsas) e de mensagens de ódio no interior das plataformas.
A preocupação com a influência externa na política dos EUA ganhou visibilidade com os indícios de que grupos russos teriam atuado nas eleições presidenciais do país em 2016. Uma investigação foi aberta no Parlamento e tanto Facebook quanto Twitter admitiram ter identificado contas controladas por russos com atuação no pleito. Perfis com responsáveis de outros países também foram localizados. O receio foi retomado com a aproximação das eleições intermediárias deste ano no país.
O presidente do Comitê, senador Richard Burr (Republicano – Carolina do Norte), destacou a insuficiência das medidas adotadas pelas empresas contra atuações nocivas no debate político, especialmente estrangeiras. “Infelizmente, essa vulnerabilidade de segurança nacional e risco inaceitável continuam sem respostas. Providências estão sendo tomadas, mas esses problemas não estão indo embora. Não tenho nem certeza se estão indo na direção correta”, comentou, em tom crítico.
A executiva-chefe de operações do Facebook, Sheryl Sandberg, reconheceu que as eleições de 2016 evidenciaram o que pode acontecer quando há abusos nos serviços da empresa, como o uso destes pela Rússia em uma campanha de minar instituições democráticas e interferir nas eleições. “Nós fomos muito lentos para entender isso e para agir. Isso é nossa culpa”, admitiu, assim como Mark Zuckerberg já havia feito nas audiências no Parlamento ricano em maio.
Ela citou como respostas apurações internas, monitoramento de conteúdos por sistemas automatizados e por profissionais e a derrubada de contas não autênticas. A executiva mencionou a remoção de contas vinculadas a grupos Russos, do Irã e de Mianmar. “Estamos trabalhando com especialistas de fora e governos para compartilhar informação sobre ameaças e prevenir abusos. Estamos ficando melhor em achar e parar nossos oponentes. Mas não temos acesso à inteligência a que o governo tem. Nós nem sabemos sempre quem está por trás dos ataques e seus motivos”, ponderou.
O chefe-executivo do Twitter, Jack Dorsey, também admitiu falhas da empresa em lidar com esse e outros problemas. “Não estamos orgulhosos de como essas interações livres entre usuários estão sendo aparelhadas e usadas para distrair e dividir pessoas e nossa nação. Nós nos encontramos mal preparados e mal equipados para a imensidão de problemas que identificamos. Abuso, assédio, exércitos de trolls, propaganda por bots [robôs] e humanos, campanhas de desinformação e filtros-bolha. Isso não é uma praça pública saudável”, assumiu.
Entre as medidas do Twitter, Dorsey citou a fiscalização e a derrubada de contas falsas em uma média de 8 a 10 milhões por semana. Segundo ele, a companhia aumentou em 200% o ritmo de remoção desse tipo de perfil no seu interior. A senadora Susan Collins (republicana – Maine), entretanto, criticou o fato de a empresa não ter avisado usuários que seguiam ou interagiam com contas operadas por agentes russos. “Precisamos de algo mais, dizer pessoas que elas pessoas foram envolvidas, vítimas inocentes de influência estrangeira”, disse. “Concordo, é inaceitável”, respondeu o chefe-executivo do Twitter.
Debate político e desinformação
O presidente do Comitê, Richard Burr, afirmou que a legislação do passado não dá mais conta dos desafios colocados pelo poder assumido por essas plataformas. “A informação que suas plataformas dissemina muda mentes. Quando você as controla, estão em posição de ganhar guerras sem disparar um tiro. Isso é o quão sério isso é”, pontuou.
Sheryl Sanberg elencou iniciativas da plataforma relacionadas às eleições – como lembretes do dia de votação para eleitores e canais de comunicação com representantes. No tocante à desinformação, mencionou as parcerias com agências de checagem para analisar conteúdos. No caso de identificação destes como falsos, continuou, os usuários são avisados e o alcance é reduzido drasticamente e artigos relacionados ao mesmo tema com diferentes perspectivas são apresentados a quem recebeu o conteúdo marcado.
Jack Dorsey mencionou, de maneira genérica, providências aos problemas e desafios da plataforma. “Aprendemos com a eleição de 2016 como proteger esses processos. Ferramentas mais fortes, políticas melhores e parcerias estão ocorrendo. Mas temos que pensar maior. Temos que perguntar o que o Twitter está incentivando as pessoas a fazer ou não fazer e por quê”, afirmou. Contudo, não apresentou medidas para as críticas de senadores tanto à desinformação quanto a mensagens de ódio.
Ao ser questionado sobre o uso de robôs (bots) na rede social, prática bastante questionada tanto nas eleições de 2016 quanto em outros períodos, Dorsey concordou que a plataforma deve buscar informar seus usuários. “Eu acho que usuários do Twitter têm direito a mais contexto com quem estão interagindo. Em podendo identificá-los, podemos por um rótulo. Estamos considerando isso, estamos interessados. Mas o que é mais difícil é quando um sistema opera para parecer um ser humano”, colocou.
Liberdade de expressão e discurso de ódio
O senador Angus King (Independente – Maine) ponderou, entretanto, que os problemas não se resolvem apenas com remoção de contas falsas, uma vez que a desinformação pode ser difundida por usuários “reais”. O parlamentar apontou o cuidado neste tipo de atuação em razão das dificuldades na definição do que é verdade e o que não é.
“Estou desconfortável na definição do limite entre o que é remover informação ‘fake’ e o que outro pode considerar legítimo. Temos que estar certo que não estamos censurando, mas provendo informação e contexto”, alertou King. “Quando estamos lidando com pessoas reais difundindo conteúdos falsos. Há grandes implicações de liberdade de expressão”, reforçou o senador Martin Heinrich (Democrata – Novo México).
“Delimitar a linha entre o que é discurso de ódio e o que é desinformação é muito difícil. Especialmente se você está dedicado a expressar liberdade de expressão. E em alguns momentos, liberdade de expressão é expressar coisas com as quais você discorda”, respondeu Sandberg. A executiva acrescentou que em razão desta dificuldade a empresa não avalia, ela própria, se um conteúdo é falso ou não, deixando essa tarefa para agências de checagem.
A senadora Kamala Harris (Democrata – Califórnia) questionou a representante do Facebook sobre uma reportagem do site norte-americano ProPublica, segundo a qual analistas de conteúdo da equipe da empresa eram treinados para não derrubar conteúdos de ódio contra determinados segmentos, o que terminava por beneficiar perfis de homens brancos.
“Foi uma má política. O discurso de ódio é contra nossas políticas e tomamos medidas fortes para remover esse tipo de conteúdo. Nós nos preocupamos com direitos civis, temos trabalhado com grupos nessa área para encontrar”, justificou Sandberg.
Soluções
O vice-presidente do Comitê, Mark Warner (Democrata – Virgínia), defendeu que o Congresso deve entrar em campo. O parlamentar listou um conjunto de desafios para os quais as empresas não têm apresentado respostas efetivas e que deveriam ser considerados em eventual regulação.
“Os usuários não têm direito de saber quando estão interagindo com bots nas suas plataformas? Por que seus termos de serviço são tão difíceis de achar e impossíveis de ler ou entender? Por que não deveríamos adotar ideias como portabilidade de dados e minimização, ou consentimento do titular? Que tipo de accountability [transparência e fiscalização] deve existir em seus modelos falhos de publicidade que vocês utilizam?”, indagou.
Ausência do Google
Os senadores criticaram a ausência de representantes do Google na audiência. “Google tem uma imensa responsabilidade nesse espaço [da internet] dado o seu tamanho e influência. Eu pensei que os líderes do Google queriam mostrar o quão levam a sério esses desafios”, disse o senador Mark Warner.