A decisão que negou a extradição do empresário turco Ali Sipahi pode beneficiar outras pessoas em situação semelhante e facilitar pedidos de refúgio, na avaliação da Defensoria Pública da União. Nesta terça-feira(6), a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou por unanimidade o pedido da Turquia para que Ali, que vive há 12 no Brasil, fosse enviado ao país natal para responder pela acusação de terrorismo.
Para o defensor João Paulo Dorini, foi importante os ministros reconhecerem que além de não se aplicarem as condições para extradição, se tratava de um processo político. “O Supremo analisou o mérito mesmo não necessitando. Isso é importante não só para o caso em si, mas para repercussão para todos os casos similares de extradição de cidadãos turcos que vierem a acontecer no Brasil. Eu entendo que isso beneficiará os pedidos de refúgio que hoje estão parados no Conare [Comitê Nacional para Refugiados do Ministério da Justiça] que aparentemente estavam esperando essa decisão do STF”, disse hoje (7) ao comentar o desfecho do caso ao lado do próprio Ali.
Em abril, o empresário chegou a ser preso pela Polícia Federal em função do pedido de extradição, mas deixou a prisão após o ministro Edson Fachin, relator do caso, substituí-la por medidas cautelares. Segundo o governo da Turquia, o empresário depositou, entre 2013 e 2014, cerca de mil liras turcas em um banco que, na visão do governo local, financiaria o terrorismo.
Fachin sustentou que a acusação de terrorismo não estava tipificada na legislação brasileira em 2013, quando o governo turco acusou o empresário de fazer os depósitos. A lei que trata da questão foi sancionada em 2016. A dupla tipificação é uma das condições para a concessão da extradição. O voto foi seguido pelos ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e a ministra Cármen Lúcia.
“Para que um estrangeiro possa ser extraditado, tem que haver a previsão de delito tanto no Estado estrangeiro quanto no Estado brasileiro”, enfatizou Dorini sobre a situação de Ali. “Dificilmente se vê uma decisão unânime do Supremo Tribunal em algum casos de relevo”, acrescentou o defensor sobre a importância do julgamento.
No julgamento, a maioria dos ministros seguiu voto proferido pelo relator. De acordo com o ministro, é fato notório que a Turquia vive uma instabilidade política e há dúvidas de que o empresário será submetido a um julgamento justo se for extraditado. O empresário afirma que simplesmente depositou o dinheiro dos presentes de casamento em um banco ligado ao Movimento Hizmet, uma organização civil que passou a ser acusada de terrorismo após fazer oposição ao governo do presidente Recep Tayyip Erdogan.
Retomar a vida
Ali Sipahi contou que a decisão trouxe alívio para sua família e para a comunidade turca no Brasil, que acompanhava seu caso com atenção. “A comunidade turca aqui também ficou aliviada, porque eles estavam esperando essa decisão. Uma coisa que vai decidir como vai ser o futuro deles. Muitas pessoas deixaram os bens e os familiares na Turquia e estão começando do zero”, disse a respeito da possibilidade do caso repercutir em outros pedidos de extradição que podem ser feitos pelo governo de seu país natal.
Apesar de afastado o risco de prisão, Ali diz que precisa manter a cautela, uma vez que o governo Erdogan é conhecido por fazer represálias aos seus opositores. “Agora não sou uma pessoa normal. O caso teve uma repercussão muito grande tanto aqui, quanto na Turquia também. Eu tenho que tomar cuidado por onde vou passar e evitar onde posso ter problemas”, acrescentou.
No momento, no entanto, a sensação é de alívio, tanto no núcleo familiar da mulher e o filho, quanto dos pais e sogros, que permanecem na Turquia. “Eles também ficaram muito perturbados nesse processo. Eles ficaram muito felizes”, disse sobre o desfecho do processo. “Passei quase a metade da minha vida aqui no Brasil. Fiz universidade aqui. Comecei a trabalhar aqui. Casei, tenho filhos aqui”, enfatizou ao falar das fortes relações que mantém com o Brasil, onde tem um restaurante de entregas.