Campanha busca promover clareza e transparência na rotulagem de alimentos

Você sabe o que está comendo? Conhece os ingredientes e as propriedades nutricionais dos produtos industrializados que sua família consome? Entre letras pequenas, nomes impronunciáveis e informações confusas que exigem cálculos complexos (afinal, quem é que come apenas 2,5 unidades de uma bolacha recheada?), não é nada fácil a tarefa de compreender as informações que estão nas embalagens dos alimentos disponíveis no supermercado.

É com os objetivos de exigir clareza e transparência na rotulagem das informações, de permitir uma escolha consciente ao consumidor e de dar visibilidade ao debate sobre rotulagem dos alimentos industrializados que instituições do Rio Grande do Sul ligadas à saúde, à pesquisa e à educação se uniram à campanha nacional pela rotulagem nutricional adequada e promovem nesta quinta-feira, 16 de agosto, um evento de lançamento da campanha no Estado. A atividade será no Auditório 1 da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação da UFRGS, a partir das 14h.

Conforme o Código de Defesa do Consumidor, é direito básico do cidadão “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”. Contudo, em estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), 40% dos entrevistados afirmaram ter dificuldade em compreender a tabela nutricional. Ressalta-se que o próprio Idec admite que esse percentual pode estar sendo subestimado em razão do perfil dos consumidores que responderam à pesquisa: mais de 70% declararam ter ensino superior completo ou pós-graduação – índice consideravelmente maior que o da média da população brasileira, que tem apenas 16% dos trabalhadores com formação superior, segundo dados da Pesquisa Nacional de Domicílios (Pnad) de 2014.

A coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Prevenção de Doenças Crônicas na Infância da UFRGS, professora Noemia Perli Goldraich, informa que também se busca com a campanha mobilizar a população para uma consulta pública que deve ser promovida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) neste semestre. “Esta é uma oportunidade que nós todos temos de participar e dar a nossa opinião e dizer qual o modelo de rotulagem que é o melhor para a nossa saúde”, enfatiza Noemia, lembrando a epidemia de obesidade e de pressão alta que acomete até mesmo crianças em idade pré-escolar no país.

“Essas alterações estão diretamente associadas a uma alimentação com excesso de sal, açúcar e gorduras, encontrada principalmente em produtos tais como salgadinhos, bolachas recheadas, nuggets, massas instantâneas, pizzas congeladas, refrigerantes, salsichas e assemelhados, todos produtos ultraprocessados, que passaram a fazer parte da nossa alimentação em substituição à comida de verdade: arroz, feijão, frutas e verduras in natura. Os rótulos como apresentados atualmente não permitem saber o que nós estamos comendo. E na verdade, nós temos o direito de saber”, reforça a professora.

Integram essa campanha a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), representada pelo Núcleo Interdisciplinar de Prevenção de Doenças Crônicas na Infância da Pró-Reitoria de Extensão (Prevenção UFRGS) e pelo Curso de Nutrição, o Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), o Conselho Regional de Medicina (Cremers), o Conselho Regional de Nutricionistas da Segunda Região (CRN-2) e a Associação Gaúcha de Nutrição (Agan). Já manifestaram apoio à iniciativa também o Conselho Regional de Odontologia do RS, a Faculdade de Medicina da UFRGS, o Colégio Estadual Julio de Castilhos, o Colégio de Aplicação da UFRGS, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) e a ADUFRGS.

Debates na Anvisa

Um grupo de trabalho da Anvisa, composto por vários segmentos da sociedade, vem estudando o assunto desde 2014 e propôs dois modelos. O defendido pelo grupo, inspirado no padrão vigente no Chile desde 2016, foi elaborado pelo Idec em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Amparada por diversos estudos e pesquisas científicas e de opinião, e em sintonia com recomendações de organismos internacionais de referência em saúde e alimentação saudável, a proposta inclui selos frontais de advertência indicando o excesso dos nutrientes críticos, como açúcar, sódio e gordura, e a presença de adoçantes, restrições de publicidade direcionada às crianças e a clareza e a legibilidade das informações nutricionais.

“O modelo frontal de advertência é apoiado pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS), é adotado no Chile, Peru, Israel e Canadá. Está em tramitação no Uruguai. No Brasil, praticamente todas as principais entidades ligadas à saúde, como Inca, Abrasco, Fiocruz, USP, entre muitas outras, apoiam este modelo”, salienta Noemia.

Já a proposta apresentada pelos representantes da indústria alimentícia consiste na aplicação de rótulo frontal de semáforo nutricional quantitativo, baseado na experiência do Reino Unido, que informa as quantidades absolutas e relativas de calorias, açúcares, gorduras saturadas e sódio e utiliza as cores vermelha, amarela e verde para indicar o alto, médio ou baixo nível de cada componente.

Semáforo proposto para orientação. Foto: Divulgação

“Há um semáforo, que causa confusão, porque se haverá um verde, um amarelo e um vermelho, você terá de parar e pensar se o produto é bom ou não para você. Na verdade, a indústria, que visa lucro e não está preocupada com a nossa saúde, quer continuar a nos confundir”, opina a professora.

Conheça a proposta do Idec

Rotulagem nutricional frontal de advertência – A principal mudança é a inclusão de um selo de advertência na parte da frente da embalagem de alimentos processados e ultraprocessados (como sopas instantâneas, refrigerantes, biscoitos, etc.) para indicar quando há excesso dos nutrientes críticos: açúcar, sódio, gorduras totais e saturadas, além da presença de adoçante e gordura trans em qualquer quantidade.

Se tem selo, não tem publicidade – Alimentos que receberem o selo de advertência estarão proibidos de exibir qualquer tipo de comunicação mercadológica direcionada a crianças (como personagens, desenhos ou brindes) e não poderão exibir informação nutricional complementar – aquelas mensagens como “rico em fibras” e “0% gordura trans” que induzem o consumidor a uma imagem saudável do produto.

Ingredientes culinários – Sal, açúcar, óleos vegetais, como os de soja, milho, girassol e oliva, e gorduras, como a manteiga, terão frases incentivando o uso moderado ao cozinhar e preparar refeições.

Textos legíveis – Padronização da exibição dos elementos da rotulagem nutricional já existentes, em especial a lista de ingredientes e a tabela nutricional. Entre as definições previstas estão tamanho mínimo de letra, tipografia específica, fundo branco que garanta contraste suficiente para a leitura e espaçamento adequado entre os itens.

Porções reais e comparáveis – As informações deverão ser apresentadas por 100g ou por embalagem (conteúdo completo), facilitando a comparação entre dois produtos.

Lista de ingredientes mais visível – Obrigatoriedade da declaração do número total de ingredientes. Com essas informações, ficará mais fácil verificar o grau de processamento de um produto: se a lista apresenta muitos ingredientes e com nomes pouco familiares, provavelmente esse alimento é ultraprocessado e prejudicial para a saúde.

Serviço

O quê: Lançamento da Campanha de Mobilização Pela Nova Rotulagem Nutricional de Alimentos para o Brasil
Data: 16 de agosto de 2018 – quinta-feira
Hora: 14h
Local: Auditório 1 da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação – Fabico (Rua Ramiro Barcelos, 2705 – Campus Saúde)
Programação:
14h – Abertura Institucional e boas vindas, com Noemia Perli Goldraich – Núcleo Prevenção Doenças Crônicas Infância da UFRGS; Milton Berger – Hospital de Clínicas de Porto Alegre; Mauro Czepielewski – Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul; Jacira Santos – Conselho Regional de Nutricionistas 2a Região; Rosângela Parmigiani – Associação Gaúcha de Nutrição; e Cláudia Aristimunha – Pró-Reitoria de Extensão UFRGS
14h40min – Comunicação, Cidadania e Consumo, com Aline Strelow – FABICO/UFRGS
14h55min – O Guia Alimentar e os Ultraprocessados: o quanto você conhece?, Com Mariana Diehl – UFRGS
15h10min – Rotulagem Frontal de Advertência: o modelo que defendemos, com Laís Amaral Mais – IDEC- SP
15h35min – Apresentação da proposta da Campanha, com André Iribure – SECOM/UFRGS
·16h – Debate para construção de estratégia da campanha e redação de documento final