O crescimento da dívida dos estados e dos municípios com a União deve seguir em uma trajetória insustentável, caso os juros que incidem sobre os débitos não sejam revistos em todos os contratos em vigor. É o que aponta a Federação Brasileira das Associações dos Auditores Fiscais Estaduais (Febrafite).
Os auditores fiscais estaduais pretendem entregar essa e uma série de propostas aos governadores eleitos e reeleitos, como alternativas às discussões sobre o endividamento dos estados e municípios com o futuro governo de Jair Bolsonaro. O assunto deve ser um dos temas da reunião com os governadores do Nordeste marcada para amanhã (21).
Variações
O presidente da Febrafite, Juracy Soares, disse à Agência Brasil que a maior parte do estoque da dívida dos estados ainda tem como indexador o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) mais juros de 6% a 7,5% ao ano para estados e Distrito Federal, e IGP-DI mais taxa de 9% ao ano para os municípios.
De acordo com Juracy Soares, em 20 anos esse indicador sofreu uma variação acumulada de 1.400%, seis vezes maior que a média da inflação do período, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que somou um crescimento médio de pouco mais de 230%.
Segundo o auditor fiscal, a dívida bruta dos estados e municípios com a União chegou a R$ 908 bilhões, de acordo com o Tesouro Nacional.
“A forma de atualização desses empréstimos é injusta, porque a União pactuou com estados e municípios usando um índice que é muito superior à média de variação da inflação. Se as receitas dos estados crescem de acordo com o índice da inflação oficial, como é que eles vão conseguir pagar uma conta que cresceu 1.400% desde o fim dos anos 1990 para cá, o que dá quase seis vezes o IPCA?”, destacou.
Novos indexadores
Em dezembro de 2015, o governo federal editou um decreto regulamentando os novos indexadores para as dívidas dos estados, que passaram a ser corrigidos pela taxa Selic (atualmente em 6,5% ao ano) ou pelo Índice Geral de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o que for menor, mais 4% ao ano. A mudança foi resultado da aprovação de um projeto de lei complementar no Congresso Nacional, mas só passou a valer para contratos assinados a partir de janeiro de 2013.
“A maior parte do montante devido continua sendo atualizado com base no indexador anterior, não contempla o recálculo do contrato desde o começo. O que a gente defende é o refazimento dos contratos. Tem que ser calculado com base no IPCA desde o início, senão a dívida continuará contaminada por aquele indexador injusto”, argumentou Soares.
Para o presidente da Febrafite, um equívoco foram as desonerações de impostos realizadas pela União que também impactaram na arrecadação dos estados, como no caso redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis e outros produtos industrializados, concedida ao longo dos últimos anos.
“Quando a União isentou a produção de automóveis de IPI, ela acabou fazendo cortesia com chapéu alheio, porque parte do IPI tinha que ser repassada, via transferência constitucional, para os estados, mas aí a União abriu mão de receita que seria dos entes federativos, enquanto equilibrou suas finanças aumentando contribuições”, disse.
Guerra fiscal
Em relação à arrecadação dos estados, Juracy Soares disse que é preciso enfrentar uma reforma tributária que transforme a atual modelagem do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é o principal tributo estadual, mas tem sido alvo de uma “guerra fiscal” entre as próprias unidades da federação.
“O ICMS, desde o seu nascedouro, foi cobrado na produção, e isso faz com que os estados tentem atrair indústrias usando como aceno a isenção tributária ou redução drástica do imposto. Acaba que essa luta é fratricida, estado brigando contra estado e desequilibrando as contas uns dos outros.”
Para a Febrafite, o ideal seria a transformação do ICMS em Imposto sobre Valor Agregado (IVA), cobrado no destino, sobre o consumo, o que acabaria com a atual “guerra fiscal”, que acaba pesando sobre os pequenos e médios empresários. “São esses que acabam tendo que suportar a carga tributária porque não conseguem a isenção ou redução de imposto que as grandes empresas conseguem.”