CLIMA E URBANISMO

Urbanismo sensível à água é apontado como caminho para reduzir impactos das enchentes

Especialistas defendem integração entre planejamento urbano, natureza e políticas públicas para enfrentar eventos climáticos extremos.

Foto: Freepik
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Nos últimos anos, o Brasil tem enfrentado episódios cada vez mais frequentes de enchentes, alagamentos e deslizamentos de terra, especialmente em áreas urbanas densamente ocupadas. No próximo mês, por exemplo, é completado um ano da maior tragédia climática do nosso país – que provocou danos em quase todos os municípios do Rio Grande do Sul, devastou cidades principalmente na Região Metropolitana e Vale do Taquari, retirou milhares de casa e deixou 184 mortos, além de 25 desaparecidos.

Mas afinal, o que tem causado um alerta geral sobre mudanças climáticas e colapso urbano? De modo geral, a combinação entre ocupação desordenada, infraestrutura defasada ou inexistente e a intensificação das mudanças climáticas tem colocado à prova a capacidade de resposta das cidades. Diante desse cenário, o urbanismo e a arquitetura se apresentam como peças-chave para transformar essa realidade e construir soluções de longo prazo.

De acordo com a arquiteta e docente do Centro Universitário UniBH, Flávia Papini, os desastres causados pelas chuvas não são apenas fruto da intensidade das precipitações, mas, também, da forma como as cidades foram planejadas — ou muitas vezes, não planejadas. “A maneira como construímos e ocupamos o espaço urbano impacta diretamente a capacidade de drenagem e absorção da água da chuva”, destaca. “A impermeabilização excessiva do solo, causada pelo asfalto e concreto sem áreas de infiltração, impede que a água da chuva siga seu curso natural, gerando enchentes e sobrecarregando sistemas de drenagem urbana”, explica.

Uma das soluções arquitetônicas destacadas pela especialista são os jardins de chuva — estruturas que combinam vegetação e engenharia para reter, filtrar e infiltrar a água no solo. “Esses jardins são formas simples e eficazes de devolver ao solo a sua função de absorver água. Quando bem integrados ao espaço urbano, eles também contribuem para a qualidade paisagística e o microclima das cidades”, completa Flávia.

Outros exemplos incluem a implantação de telhados verdes, pavimentos permeáveis e o reaproveitamento de áreas de várzea como parques urbanos. Essas estratégias fazem parte de um conceito mais amplo, o urbanismo sensível à água. “Não se trata apenas de resolver alagamentos pontuais, mas de pensar a cidade de maneira sistêmica, com soluções que considerem as bacias hidrográficas, os ciclos naturais da água e a convivência entre espaços urbanos e natureza”, reforça Papini.

As enchentes não são apenas um problema de engenharia, mas o reflexo de um fenômeno global: as mudanças climáticas. Elizabeth Ibrahim, professora do curso de Engenharia Ambiental do UniBH, destaca que “os eventos climáticos extremos, como chuvas intensas em curtos períodos, estão cada vez mais frequentes por conta do aquecimento global. As cidades precisam se adaptar a essa nova realidade com urgência”.

Para Flávia Papini, a resposta está na integração entre conhecimento técnico e vontade política: “Não basta termos boas ideias ou projetos premiados. É preciso vontade de implementar essas soluções em larga escala, com participação da comunidade, fiscalização e investimento contínuo. Só assim conseguiremos cidades mais seguras, sustentáveis e preparadas para o futuro”, conclui.