Em 18 anos de existência, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação triplicou o número de áreas protegidas no país. A chegada à maioridade, nessa quarta-feira (18), também marca os desafios que o sistema – que estabelece critérios e normas para a criação, implantação e gestão de áreas de preservação dos ecossistemas– tem pela frente, como o combate à grilagem de terras e maior integração.
As unidades somam 250 milhões de hectares. O Brasil tem atualmente 2.201 unidades federais, estaduais ou municipais. Do total, 698 são de proteção integral, como estações ecológicas, monumentos naturais, parques nacionais, estaduais ou municipais, refúgios de vida silvestre e reserva biológica, segundo o Cadastro Nacional de Unidades de Conservação.
Outras 1.503 unidades são de uso sustentável (florestas, reservas extrativistas, de desenvolvimento sustentável, de fauna, áreas de proteção ambiente e relevante interesse ecológico).
Histórico
Após mais de dez anos de debate entre ambientalistas, gestores e parlamentares, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação foi criado no ano 2000.
Do primeiro parque nacional, o de Itatiaia, criado em 1937 até meados de 2000, foram criadas 184 unidades de conservação federais, com cerca de 38 milhões de hectares de áreas protegidas, incluindo continente, as zonas costeira e marinha.
Após a criação do sistema, foram criadas 151 unidades de conservação federais, acrescentando 134 milhões de hectares. O resultado dos últimos 18 anos representa mais de três vezes o que foi feito nos 65 anos anteriores ao sistema, sem contar as unidades criadas em âmbito estadual e municipal.
Para que uma unidade de conservação seja criada, são realizados estudos técnicos e consulta pública para identificar a localização e os limites da unidade. A redução da extensão territorial das unidades só pode ser feita mediante lei específica.
“As unidades de conservação têm um papel importantíssimo para a conservação da biodiversidade. Nesse sentido, um sistema de unidades que articula os três níveis de governo, inclusive a sociedade considerando as Reservas Particulares do Patrimônio Natural, traz contribuições determinantes para a manutenção do patrimônio natural brasileiro”, destacou o Ministério do Meio Ambiente por meio de nota.
Avanços e desafios
Para especialistas e gestores, o sistema representou um avanço e chega à maioridade com desafios, entre eles a dificuldade de gerir unidades em um país de dimensão continental, garantir que as áreas não sejam invadidas por grileiros de terra e diminuir o desmatamento.
“A gente tinha antes uma legislação que era toda espalhada, tinha resolução, decreto. O sistema trouxe de fato um avanço no sentido de colocar todas as categorias de unidade embaixo do mesmo guarda-chuva”, disse Nurit Susan, bióloga do Instituto Socioambiental (ISA).
No entanto, a pesquisadora pondera que ainda precisa melhorar a integração entre as unidades e contextos locais. “Em um sistema, você imagina que as coisas se articulam entre elas, que aquelas unidades de conservação dialogam entre elas, numa escala regional e nacional, e com a paisagem local onde estão inseridas, não só paisagem física, biológica, mas também social, cultural e econômica, coisa que não acontece ainda, apenas pontualmente”.
Para a bióloga, outro desafio é regularizar a situação fundiária das terras das unidades. Sem regularização, as unidades ficam vulneráveis à degradação, redução de limites ou até extinção. “Você tem dentro das unidades de conservação um número relevante de áreas que ainda não tiveram sua regularização fundiária. Isso é muito grave porque dá um grau de vulnerabilidade para essas unidades e convida a uma situação de invasão, grilagem.”
Além das dificuldades de gestão, a regularização se torna mais difícil devido à falta de recursos para a indenização de quem deve deixar a área.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e responsável pela gestão das 335 unidades federais, admite que a regularização fundiária é um dos passivos.O instituto estima que diversas propriedades particulares estão dentro dos limites das áreas protegidas. Só na Mata Atlântica existem 600 mil hectares com áreas privadas, segundo a entidade.
O Ministério do Meio Ambiente acrescenta melhorar o diálogo entre os entes federados, ampliar os recursos para a implementação das unidades, a prestação de melhor serviço e a elaboração de planos de manejo.
Conscientização
Outro ponto é a conscientização da sociedade para a importância das unidades por meio da educação ambiental nas escolas e o ecoturismo. Segundo o ministério do Meio Ambiente, em 2017, as unidades de conservação receberam a visita de 10,7 milhões de pessoas. O número de visitantes cresceu quase 340% nos últimos dez anos.
Vários lugares turísticos do país estão situados dentro de unidades de conservação, como o Corcovado, no Rio de Janeiro, que fica no Parque Nacional da Tijuca. As Cataratas de Foz do Iguaçu e o Pico da Neblina – ponto mais alto do país – que estão em parques nacionais. Outras unidades têm a presença de comunidades e povos tradicionais, que mantêm práticas e modos de vida compatíveis com a proteção do meio ambiente.
“Falta essa percepção de que essas paisagens que são tão emblemáticas, tão constituidoras da identidade nacional, estão protegidas pelo Sistema Nacional de Conservação. A sociedade não tem conseguido ampliar o reconhecimento dessas [unidades] como patrimônio nacional, como algo que deve ser valorizado por todos”, destaca Nurit.
A bióloga sugere que as funções do sistema sejam discutidas nas atividades do ecoturismo e no ambiente escolar. O Instituto Socioambiental também chama a atenção propostas legislativas que possam dificultar o processo de criação das unidades ou reduzir os limites. Mais de 50 unidades tiveram os limites alterados desde 2011, segundo levantamento do ISA.
Mais recursos
Recentemente, a Presidência da República sancionou uma lei autorizando o ICMBio a contratar banco público para criar um fundo de financiamento das unidades federais de conservação. O fundo será composto por recursos da chamada compensação ambiental, que é paga pelos responsáveis por grandes empreendimentos que causam impacto ambiental significativo, como fábricas ou hidrelétricas.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, os recursos chegam a R$ 1,5 bilhão. Com a nova lei, a expectativa é que o sistema direcione cerca de R$ 1,2 bilhão para estruturação física das unidades de conservação, como melhoria da área de visitantes de parques nacionais. Deste total, cerca de R$ 800 milhões poderão ser alocados em processo de regularização fundiária
O Ministério do Meio Ambiente conta ainda com aproximadamente US$ 250 milhões de doações internacionais para unidades federais e estaduais.