O Departamento de Homicídios da Polícia Civil deflagrou, nesta terça-feira (3), uma das maiores operações de combate a uma facção criminosa que atuava na região metropolitana de Porto Alegre. Ao todo, 22 pessoas foram presas na “Operação Cidade de Deus”. Entre os detidos está o vereador José Francisco Soares, o Juca (PSD), que teria envolvimento com a quadrilha. A organização criminosa estaria envolvida em, ao menos, 30 homicídios ocorridos no Rio Grande do Sul.
Ao todo, 82 ordens judiciais foram cumpridas em oito municípios gaúchos: Porto Alegre, Gravataí, Cachoeirinha, Esteio, Guaíba, Portão, Tramandaí e Pelotas. Entre as apreensões, estão máquinas caça-níqueis, ceduleiras, móveis, documentos, telefones celulares e drogas. Na ação de hoje, foram empregados cerca de 250 policiais civis e 60 viaturas, com o apoio da Divisão Aérea da Polícia Civil.
Conforme a Polícia Civil, o vereador Juca teve sua campanha eleitoral financiada pela facção criminosa “liderada” pelo irmão dele, Tiago Soares da Silva, o “Tiago Pequeno” ou “Zé Pequeno”. O criminoso já responde a nove inquéritos por homicídios. Também possui antecedentes por cinco assaltos a banco, roubo de veículos, arrombamento de caixas eletrônicos, tráfico de drogas e porte ilegal de arma de fogo.
O vereador possui antecedentes por ameaça e por tentar entregar aparelhos telefônicos em uma penitenciária. Ele receberia uma espécie de “mesada” da quadrilha gerenciada pelo irmão. A facção também seria responsável pela destruição de publicidade legal de adversários políticos. Por isso, já era alvo de investigações do Ministério Público Federal por suspeita de ligação do parlamentar com a organização criminosa. Além de Juca, a Justiça determinou a prisão de assessores.
A defesa do vereador ainda não se pronunciou sobre a prisão dele.
Entenda o caso
A investigação teve início em julho de 2020, a partir de uma delação premiada que apontou a autoria de 31 homicídios praticados pela mesma organização criminosa. Os homicídios ocorreram nas cidades de Gravataí, Cachoeirinha, Porto Alegre, Canoas, Sapucaia do Sul, Guaíba, Eldorado e Taquara.
Na delação, foram indicados 79 membros de uma das maiores organizações criminosas do Estado, o que resultou na instauração de Inquérito Policial para apurar a estrutura criminosa. Com o avanço da investigação, os policiais identificaram que a facção “contava com divisão hierárquica precisamente definida e com separação das atividades em núcleos distintos e interligados”.
Dentre eles estava um núcleo de crimes violentos e tráfico de drogas, em que os executores dos homicídios recebiam como “prêmio” pontos de venda de drogas para administrarem. Os traficantes também adquiriam facilidades para aquisição de armas e drogas que lhes rendiam maior lucro e poder. De forma resumida, a violência alimentava o tráfico de drogas e os executores ficavam mais audaciosos, sendo beneficiados pela facção com os pontos mais rentáveis.
Outro núcleo atuava em jogos de azar – como bingos e máquinas de caça-níquel –, uma atividade que rendia à organização criminosa tanto ou mais lucro que o tráfico de drogas, com a vantagem de que a administração é menos violenta, não trazendo perdas com ataques de grupos inimigos ou apreensão de drogas e armas pela polícia. A atuação em contravenções ligadas aos jogos de azar tem como área de abrangência o sul do estado, região metropolitana, capital e litoral. Antigos chefes dos jogos de azar foram obrigados a dividir lucros com a facção ou tiveram seus pontos tomados com uso de violência e ameaças.
Ainda, foi identificado dentro da organização criminosa um núcleo político. A facção tinha como plano a infiltração de membros na esfera política, com intuito de defender os interesses da organização manipulando o Poder Público. O plano teve início com a eleição de um criminoso para cargo do legislativo de um município da região metropolitana na eleição de 2020. A campanha foi caracterizada por ameaças e violência contra opositores, além de pressão contínua e troca de favores com eleitores de comunidades carentes da cidade.