Um problema tem deixado moradores da região metropolitana de Porto Alegre incomodados: a mudança na qualidade da água que chega a suas casas. A água da torneira está com “gosto e cheiro de terra”. Além disso, algumas pessoas afirmam ter apresentado problemas de saúde, como diarreia e dores abdominais, após ter ingerido o líquido que sai das torneiras.
É o caso de Vanessa Trisch, de 33 anos, moradora do bairro Imbuhy, em Cachoeirinha. Em sua casa, ela percebeu a mudança na qualidade da água nas últimas três semanas. Mas, segundo ela, outras pessoas disseram estar com esse problema há mais de um mês. “A água que sai na torneira tem coloração normal, mas o cheiro e gosto de barro/esgoto são insuportáveis e afetam até mesmo o preparo dos alimentos”, relata.
Vanessa e seu esposo contam também sobre os quadros de saúde que apresentaram depois da ingestão da água. “Eu e meu esposo tivemos dores abdominais e diarreia logo na primeira semana que percebemos o gosto e o odor. Hoje mesmo tomei um copo pra ver o gosto, e estou com dores estomacais novamente”, diz.
A entrevista de Vanessa foi concedida na quinta-feira (7). Ela só apresentou melhora no domingo (10). “Mas não consumi mais a água da Corsan”, destaca.
Problema é velho conhecido
Problemas assim, infelizmente, não são novidade no Rio Grande do Sul. Além de Cachoeirinha, também há reclamações de gosto e cheiro na água em outros municípios da região metropolitana, como Gravataí e Canoas. Em diversos anos, durante o verão, há reclamações sobre a qualidade da água entregue para consumo, principalmente em Porto Alegre.
A doutora em química Lucélia Hoehne afirma que, nesta época do ano, há o risco da água ficar com cheiro e gosto. Conforme a professora, que atua do Programa de Pós Graduação em Biotecnologia da Univates (Universidade do Vale do Taquari), a diminuição de níveis dos mananciais, o que reduz o movimento da água e, somado à presença de nutrientes na água e à forte incidência solar, favorece o crescimento de algas ou cianobactérias. Estas algas é que vão produzir as substâncias responsáveis pelo gosto, cheiro e até mesmo mudança na coloração da água.
No entanto, a especialista afirma que, se o único o elemento presente na água vier das algas, não se trata de algo tóxico. “Além de algas e cianobactérias, podem ter a presença de outros produtos químicos. O ideal é ter um laudo sobre as análises feitas na água para verificar a presença ou não de demais produtos em maiores concentrações. Se houver só a presença de algas que produzem a geosmina (que é a substância responsável por gosto, sabor e odor de terra na água), já se sabe que não é tóxico”, explica a doutora. Por isso, não é possível ter certeza de que os problemas relatados por Vanessa se devem necessariamente à qualidade da água.
Corsan: “estamos tomando todas as providências”
Procurada sobre a situação do abastecimento, a Corsan afirmou que tenta entregar água sem gosto e sem cheiro aos consumidores. “Este problema [da água com gosto e cheiro] está ocorrendo devido à alteração muito acentuada da qualidade da água bruta dos rios que utilizamos para o abastecimento, em função da estiagem e da proliferação repentina de algas. Essas algas liberam substâncias não tóxicas que conferem à água gosto e odor de terra”, afirmou a empresa por meio de nota encaminhada pela assessoria de imprensa.
“A Corsan está tomando todas as providências, em suas estações de tratamento, para eliminar esse desconforto com a máxima brevidade. Está sendo realizada dosagem de cerca de duas toneladas de carvão ativado por dia para a remoção do gosto e odor terroso. A Companhia também está monitorando o tratamento por meio de análises na rede de distribuição, identificando os pontos mais críticos em relação ao gosto. No entanto, algumas regiões podem demorar alguns dias para perceber esta melhora no gosto e odor em função da distribuição de águas ainda armazenadas em reservatórios externos e internos às residências”, conclui a empresa.
Conforme a Corsan, as substâncias citadas não trazem malefícios à saúde e que a água distribuída é segura e atende os padrões de potabilidade do Ministério da Saúde. Pesquisa realizada pela reportagem do Agora no RS não encontrou dados da qualidade da água no mês de dezembro no site da companhia. A última amostra disponível da Corsan é referente ao mês de novembro do ano passado. Nela, não consta nada fora do padrão considerado aceitável. Além dos parâmetros de turbidez, cor e cloro, não foi encontrada a presença nem de coliformes, nem de Escherichia coli (ou E. coli), uma bactéria oriunda do trato intestinal humano e animal, que pode causar diarreia.
Rio Gravataí está em nível crítico
O nível do Rio Gravataí está em situação crítica por causa da estiagem que atinge o Rio Grande do Sul. O último período de estiagem encerrou em maio passado, sendo que não houve uma recuperação satisfatória dos volumes de água no solo e subsolo. Levantamento feito pela SEMA (Secretaria de Meio Ambiente do Estado do RS) aponta que o nível do curso de água está em 0,25 metro no ponto de captação de Gravataí.
No rio Gravataí, afirma a SEMA, a combinação de pouca chuva, predominância de vento nordeste, altas taxas de evapotranspiração, e captações de água na calha do rio, possui o potencial de comprometer a disponibilidade de água para abastecimento.