A Procuradoria-Geral do Estado do Rio (PGE-RJ) denunciou hoje (4), por improbidade administrativa, o ex-governador Sérgio Cabral, o empresário Eike Batista e mais cinco pessoas. Na ação, a PGE pede a cobrança de multas civis e danos morais coletivos que totalizam R$ 327 milhões, de ressarcimento aos cofres públicos, além da aplicação de outras sanções decorrentes da prática de atos de improbidade administrativa.
A ação diz respeito ao pagamento de propina pelo empresário Eike Batista ao então governador Sérgio Cabral em dois momentos: US$ 16 milhões no exterior, pagos a uma empresa offshore de fachada mantida pelo doleiro Renato Chebar, e R$ 1 milhão pagos por intermédio do escritório de advocacia da então primeira-dama Adriana Ancelmo, que também é ré na ação. Nos dois casos, os réus são acusados de se valer de contratos fictícios para encobrir pagamentos de vantagens indevidas.
São apontados ainda como responsáveis na denúncia Flavio Godinho, ex-braço direito de Eike na EBX, e o secretário de Governo na gestão Cabral, Wilson Carlos, além das empresas EBX Holding Ltda e Centennial Asset Mining, Holding, ambas controladas pelo empresário Eike Batista.
Propina no exterior
Em setembro de 2011, atendendo a solicitação de Sérgio Cabral e de acordo com o esquema montado, desde 2010, por Flavio Godinho, Wilson Carlos e Carlos Miranda e pelos doleiros Renato e Marcelo Chebar, Eike Batista pagou, por internedio da offshore Centennial, vantagem indevida ao então governador do Rio de Janeiro, no valor total de US$ 16.592.620,00 (equivalente, no câmbio atual, a R$ 65 milhões).
“As investigações que precederam a ação penal, bem como as provas produzidas durante a fase de instrução, demonstram que, ao menos desde fins de 2008, Cabral e Eike estabeleceram uma relação de proximidade, a ponto de o empresário ter emprestado aviões do Grupo EBX para uso recreativo do então governador e sua esposa em 13 voos internacionais entre 2009 e 2016″, afirmam os procuradores. Conforme a denúncia, esse número só não foi maior por causa da revelação e da repercussão pública dos empréstimos em junho de 2011”. O empresário Eike Batista admitiu, em interrogatório na ação penal, que fez os empréstimos.
Propina no Brasil
Na denúncia, os procuradores sustentam que o mecanismo da celebração de contrato fictícios serviu como artifício de pagamento, por Eike Batista, de propina a Sérgio Cabral não apenas no exterior, mas também no Brasil, mediante a simulação de prestação de serviços advocatícios pelo escritório Coelho & Ancelmo Advogados, cuja titular era a então primeira-dama Adriana Ancelmo.
Nos apontamentos obtidos a partir da quebra de sigilo bancário da EBX Holding, controlada por Eike, chamou a atenção do Ministério Público Federal o pagamento de R$ 1 milhão a esse escritório, feito em 4 de janeiro de 2013, justificado pela pretensa prestação de serviços jurídicos. Segundo a denúncia, o pagamento, longe de ter lastro em um serviço efetivamente prestado, decorreu de uma solicitação de vantagem indevida feita por Cabral ao empresário, em razão do cargo político que ocupava e dos múltiplos interesses do empresário no estado do Rio de Janeiro.
A partir do ajuste feito entre Flavio Godinho e Adriana Ancelmo, foi expedida nota fiscal referente a honorários advocatícios no valor total de R$ 1.065.530,10 (valor líquido de R$ 1 milhão, o da propina), pago por transferência bancária da EBX ao escritório.De acordo com os procuradores, o pagamento foi identificado, mas não se pode dizer o mesmo do serviço, sobre o qual não foi encontrado nenhum documento. Os arquivos eletrônicos do escritório não registram a prestação desse serviço, também desonhecido pelos advogados daquela banca.
Prejuízos ao estado
Em um relatório de 56 páginas encaminhado à Justiça, a Procuradoria-Geral do Estado afirma que “é impossível subdimensionar a magnitude e a gravidade dos atos delitivos narrados na presente demanda. Com efeito, a partir da atuação da força-tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro, desvendou-se um universo de práticas criminosas – das quais o presente caso é importante capítulo – sem precedentes na história do Estado do Rio de Janeiro”.
O documento diz ainda que, “em estimativa nada arrojada, avalia-se que o total de recursos desviados dos cofres públicos estaduais por atuação da organização criminosa liderada por Sergio Cabral em conluio com bandidos travestidos de empresários possa chegar a R$ 1.5 bilhão, com repercussão desastrosa sobre a qualidade dos serviços públicos prestados, sobretudo, à parcela mais carente da população fluminense”.
Nas alegações, os procuradores afirmam que o “assalto ao estado” deixou marcas que ultrapassam o campo patrimonial. “Em primeiro lugar, a traição vil aos interesses da população por seus mandatários, como verificado no caso presente, propaga um verdadeiro sentimento difuso de desalento e, sobretudo, descrédito nas instituições públicas, minando, em suas bases, a própria ideia de um sistema de governo representativo voltado para satisfação da vontade geral”.
Além do ressarcimento de R$ 327 milhões aos cofres públicos, o estado pede que os envolvidos tenham seus direitos políticos cassados por 10 anos.