Em uma das funções mais complexas para um parlamentar de primeiro mandato, o deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO) assumiu a liderança do governo na Câmara com a missão de consolidar a base aliada para aprovar a reforma da Previdência, no primeiro semestre deste ano.
Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para o cargo em janeiro deste ano, Major Vitor Hugo disse que as resistências iniciais do Congresso têm sido superadas com articulações e conversas entre os partidos para sensibilização das pautas do governo federal.
Para ele, neste momento, o envolvimento do presidente é importante para aprovação das propostas do governo, porque ele tem “capital político”.
Nascido em Salvador e eleito pelo estado de Goiás com mais de 31 mil votos, o deputado é advogado, consultor legislativo da Câmara e Major do Exército na reserva não remunerada.
A seguir, os principais pontos da entrevista do parlamentar à Agência Brasil:
Agência Brasil: Qual o balanço desse primeiro mês de atividade como parlamentar e também na função de líder do governo na Câmara?
Deputado Major Vitor Hugo – Existe essa ansiedade em torno do novo líder do governo na Câmara porque é um deputado de primeiro mandato, um militar da reserva e servidor da Casa que ascendeu a deputado federal. Então isso começou de uma maneira mais tensa, mas vem se distendendo com as reuniões e com a melhor organização do Palácio do Planalto. É um governo novo, oriundo de uma eleição que só havia dois partidos políticos apoiando o presidente, ou seja, não havia uma coalizão o apoiando e também não houve o loteamento de ministérios. A base não foi pré-construída, ela está sendo construída ao longo do tempo e agora com a chegada da Joice [Hasselman, deputada do PSL e líder do governo no Congresso] e do [líder do governo no Senado, Fernando] Bezerra, o foco da Casa Civil e da Secretaria de Governo, isso vai acontecer de forma natural.
Agência Brasil: Essa é a sua primeira legislatura como deputado federal e também na função de liderança. Quais têm sido os principais desafios?
Major Vitor Hugo – O maior desafio é o aspecto de não existir uma base pré-formatada e isso está sendo superado com as aproximações sucessivas. Por exemplo, eu trouxe o Rogério Marinho [secretário Nacional de Previdência e Trabalho e ex-deputado] para conversar com as bancadas de alguns partidos e vamos retomar. Já falamos com PSD, PR, PSDB, PSL e também fiz aproximações com os líderes dos partidos. Participei de reunião do Colégio de Líderes, fui à casa do [presidente da Câmara] Rodrigo Maia [DEM-RJ], fiz algumas conversas com ele. Conversei também com Davi [Alcolumbre, presidente do Senado]. Antes era mais fácil porque havia uma base pré-formada.
Agência Brasil: Como tem sido a articulação entre os partidos com as outras bancadas na sensibilização das pautas prioritárias para o governo?
Major Vitor Hugo – O envolvimento pessoal do presidente é importantíssimo, porque ele é que tem o capital político. Ele que fez 57 milhões de votos. Isso foi inclusive levantado na reunião de líderes: pediram que ele se envolvesse, tanto que ele veio pessoalmente entregar a [proposta] da reforma da Previdência. Então, já há um engajamento pessoal dele e isso vai aumentar agora exponencialmente com rede social, com ele mesmo defendendo os pontos da reforma porque isso dá também um guarda-chuva para que os parlamentares consigam argumentar na base. A gente vai fazer todo o esforço para envolvê-lo. A gente sabe que a agenda dele, lógico, é muito corrida, mas vamos aproximar as bancadas, os líderes cada vez mais [do presidente]. Não dá para fazer uma reunião semanal dos líderes com o presidente, mas uma vez a cada mês ou dois meses. De modo particular, nesse momento da reforma não acredito que fique difícil de fazer. E o próprio conhecimento dos parlamentares e dos líderes acerca do texto vai aumentar a partir de agora. Os líderes, a própria imprensa, os analistas estão se aprofundando no texto. Algumas ansiedades já foram detectadas como a BPC [Benefício de Prestação Continuada – pago a idosos e pessoas com deficiência], a questão da aposentadoria rural, mas isso vai ser tratado no processo de negociação.
Agência Brasil: A perspectiva é que a proposta da reforma da Previdência comece a tramitar na Câmara neste mês. A liderança do governo tem uma contabilidade de votos, trabalha com uma margem de apoio?
Major Vitor Hugo – Existem estudos já publicados que apontam que os partidos de oposição vão ter algo entre 140, 150 deputados. Então, se a gente colocar 141 deputados – que o que o estudo apontava – restariam 372 deputados que poderiam potencialmente formar a base. Então, a gente quer chegar nesse número porque não pode chegar às vésperas da votação tendo uma margem apertada. São 308 votos [necessários para aprovação de Proposta de Emenda à Constituição, em dois turnos de votação]. É muito voto realmente. Nesse sentido, como ainda não instalou a CCJ [Comissão de Constituição e Justiça] e está longe de instalar a comissão especial, até chegar ao plenário a gente vai ter dois, três meses, pelo menos. A liderança do governo avalia ainda como prematuro fazer qualquer levantamento agora. Fazer um levantamento através dos líderes agora é criar uma expectativa imprecisa, porque não houve nem tempo para amadurecer um estudo em cima do texto. Então, esse número potencial de 372 [de deputados apoiando] também não quer dizer que deputados de oposição não venham votar [favoravelmente]. Pode ter certeza que mesmo os governadores dos estados do Nordeste, que são todos de partidos de oposição, estão com a ‘faca no pescoço’ com esse equilíbrio de contas. Talvez eles não tenham interesse político de verbalizar, mas em seu íntimo estão torcendo para que seja aprovada. Imagino que se houver alguma resistência, ela será quase que passiva, esperando que aprove porque vai melhorar, inclusive, para que os governadores aprovem suas contas.
Agência Brasil: O governo tem trabalhado com qual perspectiva de prazo para aprovação da reforma na Câmara?
Major Vitor Hugo: Maio, junho, é uma boa. O importante para nós é que se resolva essa questão no primeiro semestre, início do segundo, para que haja um reflexo fiscal inclusive este ano, possibilite a retomada do crescimento e do emprego, que o dólar caia, que a bolsa suba, que os juros caiam. O que a gente quer é isso. Então, quanto antes o impacto acontecer, melhor.
Agência Brasil: Houve a sinalização do presidente Bolsonaro em diminuir a idade para mulheres se aposentarem. Outros pontos polêmicos são as mudanças no BPC e na aposentadoria rural. Alguns parlamentares dizem que é muito cedo para flexibilizar o texto; outros dizem que, sem retirar esses trechos, a proposta não prossegue na Câmara. Qual é a avaliação desses aspectos?
Major Vitor Hugo: Eu entendi a manifestação do presidente como um convite ao diálogo. Isso quer dizer que ele mostrou que já há uma possibilidade de conversar. A meta do governo é ter uma economia para além de R$ 1 trilhão em 10 anos. O déficit do ano passado na casa dos R$ 266 bilhões, em todos os regimes, com a projeção deste ano chegar a quase R$ 300 bilhões. A gente tem que mudar isso. Nessa crescente e nesse grau de déficit a economia em dois, três anos vai quebrar. Não vamos ter dinheiro para pagar os servidores, as aposentadorias, para fazer investimentos em infraestrutura que a gente precisa, os juros vão subir, a confiança do mercado vai diminuir. Nós precisamos fazer algo e a sociedade já tem essa consciência. Estamos confiantes de que o governo vai defender a íntegra da proposta, mas lógico, com capacidade de negociação. Tem vários outros pontos que chamamos de espinha dorsal ou princípios gerais da proposta, que não foram atacados e isso mostra que a proposta é excelente.
Agência Brasil: Existe a previsão do governo em trabalhar a comunicação da proposta para segmentos específicos, como servidores públicos e militares? No Judiciário, por exemplo, onde estão parte dos maiores salários pagos pela União, há uma grande resistência em relação à proposta. Como o governo avalia esse cenário?
Major Vitor Hugo: Os militares não estão entre os grandes salários. Houve uma mudança na estrutura remuneratória deles em 2001, que foi extremamente penosa para eles. O Ministério da Defesa fez cálculos em termos de quantos bilhões foram economizados de 2001 para cá só com aquela mudança em uma medida provisória que nunca foi apreciada pelo Parlamento. Então, os militares estão em um momento que era para ser recomposto o salário, mas, entendendo o momento do déficit previdenciário, vão contribuir de alguma medida também. Eu estive com o ministro da Defesa [general Fernando Azevedo e Silva], são cinco leis que vão ser alteradas pela proposta de reforma da Previdência – lei de remuneração dos militares, lei de pensão, estatuto dos militares, lei de serviço militar e a lei de promoção dos militares. Realmente tem que ser feito com muito cuidado. São instituições bicentenárias, carreiras que vêm evoluindo ao longo do tempo. Em relação ao Judiciário e ao Ministério Público, estão sendo feitas várias articulações. Já conversei com membros do Ministério Público do Distrito Federal, membros da Conamp [Associação Nacional dos Membros do Ministério Público] e também recebi analistas tributários, auditores fiscais. Tenho feito diversas conversas, inclusive para me colocar à disposição para receber suas ansiedades.
Agência Brasil: Quais são os temas prioritários para o governo nesta Legislatura? Como o presidente Jair Bolsonaro pensa em trabalhar esses temas dentro da Câmara dos Deputados?
Major Vitor Hugo: A reforma da Previdência é a prioridade número zero do governo, porque a partir dela vai se abrir espaço para a gente trabalhar em todas as outras frentes. Mas tem ainda a reforma tributária. O presidente tem falado: ‘Menos Brasília e mais Brasil’. Ou seja, descentralizar os recursos para a ponta da linha, onde a população efetivamente vive – estados e municípios. Hoje, a situação é invertida, a União arrecada muito mais e fica com muito mais dinheiro do que estados e municípios. Temos que fazer uma reforma tributária, administrativa, talvez aprofundar uma reforma política – que já foi feita em 2015 e terá efeitos até 2030 – mas tem muita coisa que poderá melhorar no nosso ambiente político. Tem ainda outras pautas relevantes para desenvolvimento da infraestrutura, algum aprofundamento da reforma trabalhista, o pacote anticrime para tentar reverter essa questão de segurança pública, que é caótica. Em algum momento, ao longo dos quatro anos, vai acontecer a discussão em torno da posse/porte de armas. O Parlamento me parece muito coeso em torno das pautas econômicas e dividido em torno das pautas de costume, como Escola sem Partido e alguma coisa ligada ao desarmamento – como o aumento do acesso às armas. O governo não propõe o descontrole, mas a facilidade de acesso.
Agência Brasil: Como tem sido diálogo com os partidos de oposição, uma vez que a liderança de governo não deve ficar restrita à sua base?
Major Vitor Hugo: Primeiro, tenho mantido uma postura equilibrada, vou ao plenário para participar das discussões, negociações das pautas mais importantes e mantenho lá no plenário conversa com as lideranças da oposição para diminuir, amenizar as obstruções e isso tem sido um jogo muito aberto. Não tenho tomado o púlpito para fazer críticas contumazes, duras ou passionais à oposição para que essa interlocução seja possível. Se o líder do governo se apaixona, na minha visão, pode dificultar essa interlocução. Eu já conversei com o [deputado] André Figueiredo, líder do PDT, que é um partido que tem se mostrado aberto ao diálogo. É bom que tenha o contraditório. Vou me aproximar dos líderes dos partidos que estão no outro espectro político, mas não fazia sentido eu começar por eles.