Cotidiano

Ministério dos Direitos Humanos premia escritores idosos

“Minha profissão? Pode colocar escritora”, diz Maria de Lourdes Prata, olhando para o neto para confirmar se o ofício que começou a exercer por prazer servia para responder à pergunta feita pela reportagem. O estudante de 22 anos Renato Garcia confir...

“Minha profissão? Pode colocar escritora”, diz Maria de Lourdes Prata, olhando para o neto para confirmar se o ofício que começou a exercer por prazer servia para responder à pergunta feita pela reportagem. O estudante de 22 anos Renato Garcia confirmou, e Maria de Lourdes cravou: “é escritora”. Conhecida como Lola Prata, ela é, aos 79 anos, a grande vencedora do 1º Prêmio Literário da Pessoa Idosa, do Ministério dos Direitos Humanos, com a crônica Maré Baixa.

O prêmio recebeu ao todo, 346 inscrições, das quais 272 atendiam aos requisitos solicitados. Entre elas, foram selecionadas pelo juri 25 crônicas, cinco por região do país, que foram publicadas em um livro. Os três primeiros lugares receberam respectivamente R$ 5 mil, R$ 3 mil e R$ 2 mil. O tema deste ano foi Memórias do Lugar onde eu vivo.

Lola inspirou-se na história da tia, Nair Prata, que já com a idade avançada, teve que deixar a própria casa no litoral para viver em São Paulo porque a família estava preocupada e decidiu que ela deveria ter companhia. “Submissa e confiante, abaixo a cabeça e obedeço. Na minha geração, as mulheres sempre obedecem: primeiro ao marido, e agora, na viuvez, aos filhos”, Lola descreve na crônica. O texto fala da dor do abandono do mar e do medo de não ser lembrada após a partida e fala sobre os desejos da tia não terem sido atendidos.

Para ela, ganhar o prêmio é uma grande realização. “Tudo ganha uma extensão maior e uma profundidade maior porque estou com quase 80 anos e ainda estou recebendo prêmios. Isso aumenta a autoestima e vejo que não estou invisível. Porque com a terceira e quarta idades a gente nem é notada”, diz e acrescenta: “É uma vaidade, mas é uma vaidade tão boa”.

Entre paz e alegria

A premiação ocorreu na última sexta-feira (21), em Brasília. Estiveram presentes participantes de todo o país. A artista plástica Dolores Castellões, 67 anos, que ficou entre os 25 selecionados para a publicação, teve o voo de Belo Horizonte a Brasília cancelado e teve que vir de ônibus com o marido. “Nosso voo era 11h30. A companhia aérea disponibilizou um ônibus para os passageiros. Falei com o meu marido, vamos encarar? Eu fiz uma cirurgia recentemente, mas mesmo assim queria estar presente. Chegamos no hotel 2h da manhã. Deu tudo certo”.

Dolores é autora da crônica Entre paz e alegria. Ela explica que nasceu em Juiz de Fora (MG) e mora em Pinhal (MG). “Eu tenho pouco tempo de cidade, moro lá há 12 anos, então decidi não falar das memórias da cidade. As memórias estão em mim, sou eu. Eu não falei da construção da memória de um lugar, falei da construção da memória de qualquer pessoa”, diz.

Acompanhada pelo marido, o eletrotécnico aposentado Flávio Castro, 71 anos, ela assegura: “Agora eu estou entre a alegria e a paz. Custei para chegar ai”.

Empoderamento

“O prêmio visa o empoderamento das pessoas, visa o protagonismo da pessoa idosa e é um estímulo à produção literária, mantendo sempre a atividade mental cognitiva funcionando. É o nosso objetivo, promover o envelhecimento ativo e saudável da nossa população”, diz o Secretário Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, Rogério Luiz Barbosa.

Na abertura do evento, Barbosa ressaltou a importância da se saber ler e escrever e lembrou que o índice de analfabetismo entre a população idosa é quase o triplo do índice geral da população. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 7% da população é analfabeta, o que corresponde a 11,5 milhões de pessoas. Entre aqueles com 60 anos ou mais de idade, essa taxa chega a 19,3%.