O deslizamento do Morro da Boa Esperança, ocorrido na madrugada de sábado (10), em Niterói, era difícil de ser previsto. É o que concluiu o Departamento de Recursos Minerais (DRM), órgão ligado à Secretaria de Estado da Casa Civil e Desenvolvimento Econômico. O acidente deixou 15 mortos e 22 famílias desalojadas.
Em avaliação preliminar, o órgão informou, por meio de nota, que a ruptura do maciço era de difícil previsibilidade e que foi constatada “uma combinação de fraturas na rocha com infiltrações no solo e pressão da água de chuvas anteriores”.
Segundo a nota técnica, foram deslocadas 20 mil toneladas de material, entre rocha e solo, em um “deslizamento planar profundo”, ou seja, o local da fratura não foi superficial. A ruptura se desenvolveu com infiltração de água em uma camada de solo em formação por baixo da rocha, tirando o suporte do bloco rochoso, que veio a se romper.
“Foram observados sets de fraturas (fraturas tectônicas e de alívio) na parte rochosa, e no horizonte de solo residual jovem, nítida presença de estruturas reliquiares, permitindo o desenvolvimento de planos de fraqueza naturais. Verificou-se em campo surgência de água saindo de algumas fraturas”, diz a nota técnica do DRM.
O DRM concluiu que, devido as características geológico-geotécnicas, “trata-se de um processo de difícil previsibilidade, pois a superfície de ruptura desenvolvida no maciço foi originada pela combinação de fraturas e demais descontinuidades mecânicas presentes no maciço, juntamente com a ação da percolação e pressão d’água oriunda das chuvas antecedentes.”
A avaliação foi feita no dia do acidente e os técnicos apontaram que o local ainda corre risco de novos deslizamentos, já que “existem blocos rochosos individualizados em condição instável, e o maciço como um todo ainda não entrou em equilíbrio.” A orientação é que a Defesa Civil de Niterói monitore o aparecimento de trincas e mantenha a interdição no entorno até uma nova avaliação, passado o período de resposta à urgência. As atividades de resgate devem ser suspensas em caso de chuva.
Sociedade Brasileira de Geologia
Em nota, o Núcleo do Rio de Janeiro e Espírito Santo da Sociedade Brasileira de Geologia (SBG), alertou que o mapeamento de risco geológico precisa ser atualizado a cada ano, devido à forma dinâmica como a ocupação do solo é feita nos municípios, sem as condições adequadas de controle e fiscalização pelo poder público.
“Muito se avançou nos últimos anos, mas um verão chuvoso só pode ser motivo de preocupação redobrada, num país em que a conta cai sobre os municípios e estados, entes significadamente mais frágeis. Os recursos estão em Brasília, é necessário que sejam descentralizados, para que cada um possa fazer melhor o seu papel”, diz a nota, reiterando que a “gestão de Risco Geológico não pode ser algo sazonal no nosso país”.
A SBG lembra de outros desastres com deslizamentos nas últimas décadas em Niterói: fevereiro de 1985, com um morto; dezembro de 2001, com três mortos; dezembro de 2005, com um morto; fevereiro de 2010, no Morro do Bumba, com 105 mortos; e janeiro de 2013 com mais um morto. A entidade ressalta que após o maior deles, ocorreram iniciativas importantes no país.
Apesar da reestruturação e criação de órgãos e do aprimoramento de leis, a SBG alerta, no entanto, que a situação atual é de retrocesso, com a diminuição da importância de órgãos estaduais no Rio de Janeiro, a extinção de outros, como a Mineropar (Serviço Geológico do Paraná), ou a luta para se manter, como o Instituto Geológico de São Paulo.
“As pessoas moram onde é possível. Infelizmente, ocupam áreas inadequadas por absoluta falta de condições e opção real de moradia digna. Este é o retrato do Brasil que é preciso mudar”, destaca a SGB.